23.12.08

And so this is Christmas

E eu não tinha entendido ao certo que é Natal até sexta à noite, quando me debulhei em lágrimas vendo a fonte do Ibirapuera tocar música e dançar. Logo em seguida, vi a dança das estrelas da Ponte Estaiada.
E Natal é isso: não adianta quanto te avisem que é Natal e quanto iluminem a cidade: a gente nunca vai entender que realmente é Natal quando aquela nossa ficha natalina cai. E eu sei lá os mecanismos de cada um para que essa ficha caia - para alguns ela nunca cai.
De repente, como que em um passe de mágica, inundada no clima natalino e na minha crença em Papai Noel (voltei a acreditar nele esse ano), resolvi curtir o clima natalino.
Domingo foi lindo ver a menina pequenina brincando com a árvore de Natal, boba que só, com tanta coisa nova e linda.
Sábado o shopping e a Paulista estavam tão natalinos que estavam simplesmente encantadores. Tanta gente na rua, já em clima de festa.
E ontem, voltando da happy hour, vim caminhando pela Paulista. Era de emocionar a quantidade de pessoas passeando, vendo os enfeites, vendo os shows. Famílias, crianças, velhinhos... aparentemente todos ali acreditavam em Papai Noel, assim como eu...

E para 2009 o que eu quero é basicamente isso: que 2009 deixe 2008 no chinelo.
E que todos acreditem em Papai Noel, pelo menos um pouquinho, porque essa coisa de manter o sorriso de criança mesmo quando a gente vira adulto-ultra-cético-sarcástico-cínico é quase uma questão de sobrevivência.

Top 4 desejos legais de final de ano para esse ano de 2008:

Do chefe:
"(...) Quer mudar o mundo? Basta um ato de genmerosidade ao acaso a cada momento. (...) Desejo que o melhor dia de 2008 se compare ao pior de 2009."

Da nossa equipe, para o resto do mundo:
"Em 2009 eu vou..." (ver link dois posts abaixo)

De uma empresa parceira:
"Os momentos de crise são os melhores para olhar para dentro e renovar. É a oportunidade surgindo. Que a busca por novas e boas soluções resulte em uma vida mais sustentável para todos nós"

De uma empresa amiga:
"Quando você estiver em cima da cadeira, vestindo branco, com a roupa de baixo amarela (ou rosa), comendo doze caroços de romã, doze uvas, uma colherada de lentilha, colocando o louro na carteira, segurando alguma peça de ouro, preparando a oferenda para Iemanjá e rezando para chegara tempo das sete ondinhas, lembre-se dos nossos votos. Um 2009 com a beleza das coisas SIMPLES."

Esse blog entra hoje oficialmente em recesso. Retorna em 2009.

19.12.08

Meet the Queen

Parte técnica:
simplesmente perfeita, sem nada a dizer.
Nossa super passagem secreta para o Morumbi mais uma vez produziu bons frutos. O trânsito não estava tão ruim quanto parecia e, em um intervalo de uma hora e meia, já estávamos dentro do estádio: incluindo o tempo de trânsito, de achar vaga, e de pegar fila de entrada.
Alguns do trabalho me zuaram já: "você vai para o Morumbi no automático, não sabe nem o que fazer lá, acha que está indo ver o jogo do São Paulo". Tudo bem, eu estava a caminho do Morumbi e sabia muito bem onde eu ia parar.


Parte chata:
A espera. Como demorou a espera. Era uma mistura de cansaço de ficar de pé, com ansiedade para ver a rainha, com frio na barriga de como seria o show. Encontros e desencontros e, como quando as coisas são fáceis elas são simplesmente fáceis, foi muito fácil encontrar a todos que gostaríamos.


O deslumbre:
Ela entra no palco e ela faz o que bem quer. Quando entra já está sentada no trono - sim, ela assume a posição de rainha logo no começo. Tudo aquilo, aquele cubo de mistério, aquele cone de mistério, na verdade tudo aquilo faz parte de toda uma estrutura a la nave espacial que chega chegando e, quando iluminada, faz os queixos caírem. A qualidade do som é fantástica, e a sensação é de que estamos dentro de uma caixa de som.
Ela, a rainha, a que todos os 67 mil presentes são devotos e súditos, é assim: tão rainha que aparenta imune. E pula e canta e dança e faz malabarismos como poucos, mesmo com os seus cinquenta anos. O público fica atônito, e não sabe muito bem como reagir a tudo isso. Ela é simplesmente isso: uma rainha para os seus súditosm deslumbrados.
E como toda rainha ela faz de tudo: chama o ex marido de um "motherfucker" bem suspirado e discreto em Borderline.
Traz uma trupe cigana para dançar e cantar no palco - sim, uma trupe cigana, e é lindo, e todos babam.
Senta no banquinho, faz carinha de carente, faz pessoas chorarem, quando entoa suspirando e com um violão em mãos "You must love me".
Canta "Like a Virgin" só com as palmas das pessoas e todo o Morumbi de "backing vocal".
Faz a gente pular com uma música em seguida da outra: Like a Prayer, Ray of Light, Hung Up. Todas elas com novos arranjos, maravilhosas, renovadas.
Fora todos os efeitos especiais, La Isla Bonita, Get into the Groove, todas as coreografias e o fato de ela ser rainha, incrível, tudo de bom.

No final das duas horas de show, no telão, no palco, tudo diz para o público: Game Over. Mas, quando saímos, ninguém passou ileso.

17.12.08

Frases do Admirável

Pois é. Conforme passa o tempo, a gente vai se encontrando em afinidades com outras pessoas que superam as afinidades comuns. Por exemplo, essa coisa de ser fã do Contardo Calligaris. O cara não escreve fácil, porque às vezes as verdades dele são difíceis de serem lidas, embora ele escreva gostoso e fluido - o que teoricamente tenderia a significar que todos o lêem. Não é bem isso o que acontece: pelo menos com quem eu convivo, muitos o acham intragável, pelo que ele expõe que está dentro da gente e que ninguém quer ver.

Nesse contexto, das coisas que estão dentro da gente e que ninguém quer ver, reproduzo aqui alguns trechos da coluna dele do dia 11/dez/2008: "Zoé e 0 demônio do meio-dia".

"Sobre o tal demônio do meio-dia muito foi escrito e dito: diferente dos diabos que se escondem nos cantos escuros, o que será esse malefício que nos espreita justamente quando o sol está no zênite e o mundo nos aparece sem sombras?
Uma leitura moderna diz que o demônio do meio-dia não é um bicho do inferno, mas é um sofrimento insidioso, específico de uma época em que faltam cantos escuros.
Ele é nossa própria tristeza, a depressão e o tédio produzidos por um mundo com poucas sombras e poucos mistérios.
Em outras palavras, as luzes da razão e da ciência acabaram com aquele sentido que só uma transcendência (divina ou diabólica, benéfica ou maléfica, tanto faz) podia conferir à vida.
Por excesso de luz, em suma, o mundo perdeu seus horrores, mas também seu encanto; com isso, é preciso que Deus nos proteja do demônio do meio-dia, ou seja, do tédio e da tristeza.
Ao inventar cantos escuros e ao povoá-los de "troços" inquietantes, Zoé está se protegendo contra o demônio do meio-dia -com toda razão, pois esse é provavelmente o mais pernicioso de todos.
Muito melhor se deparar com Freddy Kruger do que não achar graça no mundo.
"Filosofia do Tédio", de Lars Svenden (Zahar), é uma brilhante meditação sobre a dificuldade moderna em nos interessarmos pela vida, uma vez que ela não é mais justificada pela palavra divina ou por nossa luta heróica contra os "troços" que circulam pelas trevas.
Para Svenden, contra o tédio, ainda não inventamos nada melhor do que o remédio do Romantismo: uma mistura de anestesia (drogas lícitas e ilícitas) com transgressões que deveriam provar que estamos vivendo grandes aventuras e experiências "incríveis".
Se for para escolher, prefiro os esforços de Zoé para repovoar o mundo de monstros e demônios."
(...)
"O tédio moderno é uma forma de arrogância: a vida é chata porque nós seríamos maiores que sua suposta trivialidade insossa; tendemos a menosprezar o cenário onde nos toca viver, como se ele fosse demasiado banal para nossas façanhas. Pois bem, o segredo de Brum* é o oposto disso, é uma extraordinária humildade diante do que existe."
*Eliane Brum, autora de "O Olho da Rua", da Ed. Globo.

As pessoas não se assumem assustadas pelo demônio do meio-dia, muito menos se assumem sofrendo com o mal do tédio e da postura blasè diante de tudo. E aí, às vezes, quando eu fico encantadinha com essas coisas corriqueiras, tipo o chocolate que eu ganhei ontem da amiga do coração (e o que importa é menos o chocolate e muito mais a forma que ele foi dado), estou quase que cara-a-cara com a "extraordinária humildade" a la Eliane Brum. Nada a ver com o tédio moderno, blasè, arrogante, que o Svenden trabalha. Nada a ver com "anestesia e transgressões". Eu diria até, talvez, it's a kind of magic - não tanto pelo que faço ou deixo de fazer, e um pouco mais pelo olhar carinhoso que dou a tudo isso.

Enquanto isso, em algum quarto escuro no centro de São Paulo, alguém grita que não acredita em mágica e que não há mágica. Grita, grita tanto, perde a voz. Fica rouco e sozinho, só quem o escuta é quem está com ele dentro desse mesmo quarto escuro. Esse mesmo alguém, ainda dentro desse quarto escuro, se intoxica, principalmente com as ilícitas, ao mesmo tempo em que tomas atitudes radicais quando sai à noite e consegue extrapolar na balada toda a pressão insuportável desse mundo louco onde a leveza lhe é insustentável. Esse alguém se sente transgredindo e anestesiando, a ele mesmo e aos outros ao seu redor.
Entende tudo isso com alguma forma incrível de curtição, quando não percebe que isso nada mais é do que resultado do excesso de tédio, quando não entende que antes de tudo, seu comportamento é blasè e indiferente - e não intenso, vivido, e vívido.
A esse alguém, tudo o que eu posso fazer é desejar-lhe boa sorte.

15.12.08

Disseminando a Causa

Cartão de Natal pelo Consumo Consciente?

http://akatu.soluttia.com.br/cartao2008/

É o Instituto Akatu ajudando a gente a construir em 2009 o mundo que a gente quer.

Só colocar a fotinho, escolher os amigos, escolher sua decisão para 2009, e mandar bala.

Frases Pingadas

"O que não tem começo oficial, não tem fim oficial, então acho que você não precise falar para ele: tchau"

"Somos 16... então traz 30 pães da padaria, tá? Não precisa trazer frios, teremos carne louca além das salsichas"

"Ela quer um lugar com gente bonita, e eu só quero dançar, então devemos ir ao Grazie a Dio"

"Esse daqui é do bom, eu estava guardando para o auge"

"Oi, meu nome é Bruno. Desculpa ter derrubado meu copo no seu lindo pé. Vou equilibrar ele aqui na minha cabeça, quem sabe ele não cai"

"Vamos comprar pro Edu uma toalha de banho do São Paulo?"

"É pertinho, uma quadra, mas nunca senti tanto medo em uma distância tão pequena"

"É, eu tenho preguiça de trocar as marchas do carro, por isso que às vezes ele fica parecendo um foguete no motor"

"A vista desse lugar é incrível"

"Você está bem, né? Mas quando a gente tem um ninho em ordem, quer alguém no ninho com a gente"

"Ah, então é você que é a famosa?"

"Sim, precisamos conversar a sério sobre esse assunto"

"Essa sua evolução espiritual te abre muitas portas. Mas toma cuidado com a sua 'ingenuidade empolgada', tá? Ela pode te colocar em algumas frias pela vida..."

"Você me mordeu!! Está louca?"

"Ju, agora ele está solteiro. Ah, mas é verdade, esse não é para você... é para a Mari"

"Acho que eu vou ver a luz do outro lado do rio"

"A vela para iluminar a alma"

"Então caiu a sua restituição do Imposto de Renda?"

"Mais perto de uma popstar do que a gente poderia imaginar, né?"

"Meu fim de ano só começa com o show da Madonna"

"Uma calça florida para levar para a Bahia"

"Iríamos para Santa Catarina no Reveillon. Agora não sei mais se conseguimos chegar lá..."

"Deletei o email sobre a Sociedade Secreta com medo de queima de arquivo"

"A Helena virou lenda hoje à noite, né? Mas ela está dormindo na minha mãe"

Frases pingadas, ouvidas por mim nos últimos dias.
Nenhuma delas foi direcionada diretamente a mim, mas eu estava lá na hora, testemunhando. Elas também não fazem sentido assim, isoladas de qualquer contexto.
O sentido, sutil, delas, está na livre associação que definiu a ordem que elas foram aparecendo nesse texto. De livre associação, nem eu entendo.
Mas hoje à tarde o silêncio sereno estava aí para provar que ele existe e para apavorar idéias acuadas.

10.12.08

Argentinices deliciosas, deliciosamente Argentina

Pois bem. Fui uma vez em 2006, julho, e outra vez em 2006/2007, Reveillon.
Me apaixonei. Pela cidade. Pelo bom ar. Pelas sensações inéditas e maravilhosas. Pelo argentino em julho e pelo brasileiro no Reveillon.


Buenos Aires para mim é simples assim: paixão à primeira vista, por tudo, por todos os poros. Meu encontro/imersão/mergulho com tudo o que se tem de sensações mais positivas nesse mundo. Como se, em Buenos Aires, o mundo ganhasse cores diferentes. Como se, em Buenos Aires, viver um grande amor cinematográfico comigo mesma (auto-estima e blá-blá-blá) e com alguém (especial e inteligente e blá-blá-blá) fosse mais possível do que é em outras cidades.

Dizem as teorias psicanalíticas que paixão nada mais é do que ver o outro exatamente do jeito que a gente imagina e deseja que o outro seja - simplificando, paixão é estar de cara com o que idealizamos. E ponto. Óbvio que faz total sentido... a minha Buenos Aires é a cidade que eu imaginei para mim - e não, a minha Buenos Aires não existe na realidade de mais ninguém. Mas a cidade me emociona a ponto de eu me colocar aos prantos quando soube que nossas nove noites lá estão confirmadas.


Em Buenos Aires, e isso é estranho, eu quero simplesmente me sentir muito mais bonita e muito melhor. A cidade tem essa coisa meio mágica de potencializar o que eu tenho de melhor. Incrível, simplesmente.


Planos concretos estão aí, e a cidade está na minha perspectiva para daqui uns dois ou três anos. Perspectiva daquelas definitivas, nada de brincar de visitar a cidade, e sim de levar tudo isso de melhor no mundo a sério e por bastante tempo... (sim, basicamente vocês terão um sofá ou uma cama em Buenos Aires, pelas minhas perspectivas).


Aproveitando esse clima, e que estou mergulhada na função de conhecer mais da Outra Buenos Aires (aquela menos turística do portuñol e mais legitimamente porteña), vou colocar aqui dois posts da simpaticíssima Adriana Kuchler, ex-correspondente da Folha em Buenos Aires, e quando ela morava lá ela escrevia no querido (e recém extinto) blog Tangos e Tragédias. http://tangosetragedias.folha.blog.uol.com.br/


Portanto, reproduzo aqui dois posts dela: "Argentinices" e "Yo, Argentino". Só porque estou entrando no clima...


Argentinices (23/10/2008)
Ao longo de quase nove meses de Argentina, esse blog vem colhendo suas palavras e expressões argentinas preferidas. Algumas delas podem ajudar o forasteiro a se comunicar, outras são inteligentes, e outras, divertidas e só.
* Sí o sí (sim ou sim) = obrigatoriamente, de qualquer maneira. Ex: O Boca tem que ganhar hoje sim ou sim.
* A paso de hombre (a passo de homem) = devagar. Usado normalmente em engarrafamentos. Ex: Os carros estão andando a passo de homem.
* Te comiste un payaso? (Comeu um palhaço) = engraçadinho.
* Más solo que Hitler en el Día del Amigo/ Más sólo que Hitler en Once (Mais sozinho que Hitler no Dia do Amigo/Mais sozinho que Hitler no Onze -bairro com grande concentração de judeus) = abandonado. Geralmente usado para políticos em situação complicada.
* Ponga huevos (ponha ovos/testículos) = seja corajoso, tenha culhão.
* Inmejorable ('inmelhorável') = Melhor impossível em uma palavra só.
* Aguinaldo = 13º salário
* Tarada (idiota) = Usado normalmente para distingüir a loiras exaltadas Ex: Aí vem a "rubia tarada" (loira burra).
* Boquete (buraco/rombo/túnel) = Aplicado normalmente em tentativas de assalto a banco. Ex.: A polícia descobriu um "bando de boqueteros" enquanto tentavam entrar por um "boquete" na sede do banco x.
* Fueron felices y comeron perdices (foram felizes e comeram perdizes) = E foram felizes para sempre.
* Vaquita de san Antonio (vaquinha de santo Antônio) = joaninha.
* Ojo (olho) = Fique ligado, preste atenção.
* Viveza criolla (vivacidade criola) = malandragem argentina.


Yo, Argentino

Yo, argentino (30/10/2008)
"Yo, argentino" é mais uma das argentinices, como aquelas de um post abaixo. Além de "eu, argentino", significa "eu não tenho nada a ver com isso" ou "eu lavo as minhas mãos".
Às vésperas de deixar este blog e esta cidade, queria compartilhar com os nossos cinco leitores algumas reflexões sobre quem é o argentino, esse ser tão complexo.
Na falta de uma só definição que se encaixe perfeitamente, decidi expor algumas delas, publicadas no livro "Argentinos - Mitos, manias e milongas", que a amiga Marcia Carmo, correspondente da BBC por aqui, escreveu com Monica Yanakiew.
Com a devida autorização dada, os argentinos por eles mesmos:
* "Aqui o esporte nacional é fazer filosofia. Cai o teto da casa, e os argentinos abrem o debate: 'Foi o destino? Foram os políticos? Ou foi nossa culpa, que não soubemos construir o teto?' Analisamos todas as causas e os efeitos, problematizamos o problema. Mas consertar o teto que é bom, nada. E, quando consertamos, cometemos os mesmos erros" - Jorge Telerman, ex-vice-chefe de governo da capital argentina
* "Os argentinos gostam de falar de seus problemas e têm uma ânsia por se exibir _quando estão muito bem e também quando estão muito mal. Sofrem da combinação de melancolia e neurose" - Gabriel Juri, psicanalista
* "Sou argentino. Não tenho porque ser um traficante de otimismo" - Jorge Assis, escritor
* "Os argentinos têm duplo discurso, dupla nacionalidade, duplo passaporte e, quando algum plano econômico valoriza nossa moeda e nos faz sentir mais ricos do que somos, viajamos, esbanjamos, conquistando o apelido de 'deme dos' (me dá dois)" - Maria Laura Avignolo - jornalista
* "Os argentinos são passionais. Quando se apaixonam, se apaixonam seriamente. Endeusam o ser amado. E, quando percebem o primeiro defeito, sentem uma desilusão enorme. Por isso, oscilam entre o paraíso e o inferno" - Nik, cartunista
* "A verdade é que nós argentinos somos ciclotímicos" - Sergio Berensztein, professor de relações internacionais da Universidade Torcuato Di Tella
* "O país está sobrepensado e subexecutado", Rafael Bielsa, ex-chanceler argentino
* "Os presidentes argentinos não fazem da política uma rotina. Fazem dela uma epopéia" - Julio Maria Sanguinetti, ex-presidente do Uruguai
* "Os argentinos nascem com uma sabedoria imanente. Individualmente, se caracterizam por sua simpatia e sua inteligência. Cada um é um gênio e os gênios nunca se dão uns com os outros. Por isso, é fácil reunir argentinos, uni-los jamais" - texto de uma corrente de e-mails que circulava pelo país sob o título "Uma descrição perfeita dos argentinos"

24.11.08

Primavera

Das estações do ano, a minha preferida e a mais difícil de todas as estações.
Difícil por que?
Ora, porque é o começo do "clima natalino", desse limbo que eu não sei se me derreto com o clima lindo ou se chuto o balde e viro as costas pro mundo e fico amargando um whiskey enquanto todos confraternizam.
E porque eu sou matutadeira, então se exatos dois meses depois do meu aniversário vem o Natal e o Ano Novo, isso significa que vou me revisar duas vezes: no inferno astral e no final de ano. E ficar me revisando dá trabalho e demanda energia.
Também porque é final de ano na primavera... e todo final de ano a humanidade se auto-acomete de um mal de sempre acreditar no bug do milênio. Aparentemente ninguém acredita em vida inteligente no janeiro seguinte, porque quer terminar tudo antes disso, e encontrar com todos, e fazer tudo. Como se a cada novembro e dezembro fosse um novo fim dos tempos. Ninguém se lembra que janeiro começa tudo de novo, e continua todas as coisas que nunca pararam realmente.
A preferida por que?
Porque eu acho que é a estação do ano mais visivelmente bonita - das flores.
Porque eu acho que é a estação mais simbolicamente bonita - das coisas novas.
Porque embora eu relute contra isso, gosto do clima natalino.
Porque nasci nela - e gosto de fazer aniversário.

À poesia, as flores - há flores.




(fotos de autoria própria tiradas em 23/nov/2008 em Campos do Jordão)

17.11.08

A Lua

A Lua, quando ela roda
É Nova, Crescente ou Meia
A Lua, é Cheia!
E quando ela roda
Minguante e Meia
Depois é Lua novamente
Diz...
Quando ela roda
A Lua, quando ela roda
É Nova, Crescente ou Meia
A Lua, é Cheia!
E quando ela roda
Minguante e Meia
Depois é Lua novamente
Mente quem diz que a Lua é velha...
Mente quem diz!

"Minguante e meia"
Estou febril e filosófica hoje.
Nessa ordem - apenas para deixar bastante explícito que estar febril e essa alta temperatura por aqui acentuam minha capacidade do pensar divagante. Nunca confie em uma pessoa febril - ou confie nela em excesso.

"A lua, é cheia!"
Nesse final de semana ouvi a música acima, do MPB 4, e me lembrei daquela época nos idos de 2006 que a vida vagava entre o leve e o leviano. Quando era gostoso caminhar pelo retiro budista na noite de lua cheia cantando essa música entre amigos. Quando era tão fácil abraçar assim, de corpo e alma, a todos. Quando minha amiga me deu o presente que deveria me ajudar a abrir o meu "chakra do coração" - e de fato ajudou, porque alguns meses depois disso eu andava de mãos dadas. Daí, lembrei da noite em Buenos Aires, quando caminhávamos por Palermo, no começo tardio do janeiro de 2007, na noite de lua cheia. Eu cantava com meu irmão: "é cheia... e quando ela roda". Tínhamos comido Parmeggiana em um restaurante feito por porteños para porteños, faziam abafados 27 graus naquela noite, e a alça da minha blusa tinha arrebentado.

"Quando ela roda..."
Quinta passada, quando estava indo dormir, sozinha, no meu quarto de hotel em plena reunião de planejamento, achei na TV um desses canais de hotel que só tocam música. Estava tocando essa música. Lá fora, refletia na minha varanda o azul da lua cheia. No peito, bateu o quentinho do passado não tão distante mas aparentemente tão remoto.

"É nova"
Me lembrei - e me bateu uma súbita e inesperada e muito forte - saudades dos amigos que moram longe. Aos poucos no final de semana todos eles participaram, de um jeito ou de outro, dos meus sonhos (não os que a gente sonha acordado, os que a gente sonha dormindo mesmo). Hoje, e ainda assim, aos poucos, tento mandar alguma mensagem para eles, de alguma saudade que eu sinto.

"Crescente ou meia"
Quinta passada bateu aquela coisa de "o que eu faço com aquele eu que uma vez existiu e que não está mais aqui?". Não sei se sinto falta daquele "eu" por inteiro, talvez só de algumas partes, que fui deixando para trás conforme as circunstâncias da vida chegavam e saíam, conforme o tempo passava. "Mente quem diz que a lua é velha", mas todos deitados naquele solarium do retiro budista cantando em uníssono essa música para aquela lua que nos hipnotizava como ímãs não existe mais - mas está guardado por aqui.

"Minguante e meia"
O tal do "chakra do coração", no entanto, nunca esteve tão lacrado e fechado. Mesmo. Tudo bem que tenho estado ocupada com outras coisas - mas meus amigos reclamam da minha ausência, da minha rabugentisse, da minha falta de paciência. Minhas amigas reclamam porque sempre que elas me pedem algum conselho afetivo, eu respondo com uma pedrada - não tenho falado o que as pessoas gostariam de ouvir ultimamente.

"Mente quem diz"
Para o próximo feriado, meu lado racional me chama para Campos e meu lado emocional me chama para Floripa. Optei por Campos, indo contra absolutamente todos as opiniões que tenha ouvido a respeito disso na última semana - desde 3a passada, quando tive um surto: conheci o Yunus e ouvi, ao telefone: "tem lugar no meu quarto, vamos?". Inesperado aquele telefonema, e principalmente o teor do telefonema. Naquela mesma terça eu saí e fui comer sushi, porque tinha a nítida sensação de estar perto de algum tipo de surto. Fumei os cigarros argentinos que fiz um estoque desde que minha amiga foi para a Argentina agora em outubro. É estranho conhecer um Nobel da Paz, que de tão humano ele é, tem algo de desumano, de quase sobrenatural, de muito heróico. Na expressão dele, aquela serenidade. É estranho eliminar uma possibilidade de viagem e depois ela se voltar para mim assim, com formatos tão reais.

"Depois é lua novamente"
Não estou ficando antissocial. Mas tenho me protegido em excesso, é fato. Também acho que eu tenho engordado. Mas estou causando algumas boas reações inesperadas de algumas pessoas que me são absolutamente essenciais hoje em dia. Logo volto a fazer exercício físico, porque o corpo já reclama por todos os lados. Por hora, vou comer bolinho de chuva que a Cidoca me fez nesse café da tarde cheio de mimos da menina febril.

"Diz..."
Não sei se tem lógica, sentido, ou realidade, em qualquer uma das linhas acima. Conforme havia avisado no início, hoje estou febril. É fato, no entanto, que nesse frio-novembral-chuvoso-paulistano, eu comi o bolinho de chuva da Cidoca.

4.11.08

Impressionante

Ah, eu adoro a Grande Imprensa Brasileira.

Na capa da Folha de São Paulo de hoje, apenas dois temas: as eleições nos EUA e o nascimento do Megabanco. Temas exclusivos.
Eu até me esforcei para procurar outras notícias, pequenas que sejam, mas elas não estavam lá. Ademais desse tema, informações meteorógicas, sobre o rodízio municipal, e o índice da edição - itens default da capa da Folha.

Daí eu entro na Folha Online e de cara me deparo, de novo, com uma super importância dada às eleições nos EUA. Logo abaixo, a notícia que mais chama a atenção é "Ticiane Pinheiro briga com Luana Piovani". E a boa notícia do dia: "Receita do setor industrial (no Brasil) cresce 10,2% em setembro". Na capa da Folha Online de hoje, é verdade, eu ainda não encontrei nenhuma menção ao Megabanco.

Ah, eu adoro a Grande Imprensa Brasileira...

3.11.08

Nesse meio tempo

As coisas mudam rápido.
Amanhã vai fazer um mês que eu não posto aqui - e eu poderia claramente afirmar que é outro mundo, quiçá outra gente, por aqui.
Nas aulas da pós ano passado foi discutida a sensação de que o tempo passa cada vez mais rápido. Na verdade concluímos que o tempo só passa rápido porque, morando em uma grande cidade e tendo uma rotina corrida, somos bombardeados por informações e demandas que exigem nosso esforço e nossa concentração muito mais do que seria considerado "normal". Fizemos um teste: ora, o tempo no campo, em uma fazenda, na praia, não passa no que parece ser um ritmo normal? Pois é: o número de demandas nessa condição é consideravalmente menor.
Parece que a mesma coisa acontece com relação às mudanças para quem está nesse círculo dos globalizados hoje em dia. Elas acontecem de forma muito mais rápida, sem que no entanto eu saiba exatamente qual a real dimensão delas hoje e no futuro, e qual seria o real impacto hoje e no futuro.
Enfim, retrospectemos.

POLÍTICA
Aqui
Acabei meu 1o turno votando nulo e declarando a todos o porquê do meu nulo. Comecei meu 2o turno declarando meu voto a torto e a direita, com muito medo desse retrocesso em forma de partido político. Queria convencer as pessoas que elas fossem contra esse coronelismo barato reinante no DEM. Quando a candidata começou sua campanha nojenta e preconceituosa, justo ela, sexóloga, perguntando "é casado? Tem filhos?" vi aí um novo motivo para refletir sobre meu voto: estava voltando pro nulo. E fiquei assim, oscilante, anulada, entre o asco da campanha dela, e o repúdio ao retrocesso que é representado por ele. Domingo dia 26 eu decidi lá, eu e a urna, a urna e eu, se eu seria nula ou se eu penderia para o lado que eu penderia. Não sei afirmar que "a esperança venceu o medo", mas sei afirmar que o repúdio ao retrocesso foi maior do que o asco. Não adiantou, meu voto ficou na minoria, e o retrocesso foi oficialmente escolhido por 61% dos co-habitantes dessa cidade. Que lindo. Vivo em uma cidade de patéticos que preferem dar de bandeja a maior cidade do país a um partido que já estava em seu enterro (na cova ao lado da do ACM). Ressuscitaram o DEM/PFL/Arena, assim, sem mais nem menos.
No Rio, estava um pouco na cara que não daria Gabeira, mas bem que ele iluminou meu 2o turno, com a esperança de que um político íntegro e sem amarras chegasse a ser tão votado quando ele realmente foi. E foi um 2o turno apertadíssimo, o mascarado do Paes ganhou por pouco, e o grande vitorioso dessa eleição, além do próprio Gabeira, é o eleitor - que usou de sua força em prol de uma forte e ao mesmo tempo simbólica demonstração por mudança nesse cenário político brasileiro, que dialoga tão intimamente com a desesperança.
E 2010? Deixa 2o10 para lá, porque embora a grande imprensa adore colocar na nossa cabeça que uma coisa está atrelada com a outra, na verdade a gente sabe que eleições de prefeitura não influenciam diretamente eleições de presidência - até porque, com a crise que aos poucos dá sua cara, demosntrando sua feição cada vez mais devastadora, tudo em qualquer contexto em qualquer cenário fica, na verdade, bastante imprevisível.

Amanhã começam oficialmente e terminam definitivamente as eleições que estão "pipocando em soft opening" desde semana passada. Pesquisas fazem previsões extremamente irregulares, muitas dando vitória ao simpático candidato negro, e embora o resto do mundo, se votasse, já teria eleito o Obama, não dá para confiar nisso tudo não. Dizem os analistas de política mais conscientes que eleger McCain/Palin é fazer papel de palhaço perante o mundo. Eu hei de concordar - mas não hei de duvidar que o eleitorado americano seja capaz de uma coisa dessas. Imprevisibilidade tem sido o mote de várias das últimas eleições americanas, e o sistema de colegiado deles dá ainda mais espaço para isso. Torço sim, com toda a minha força pro Obama - mas quem viver, verá - e eu só acredito vendo.

ESPORTE
Pois é. Quando começou o returno desse Brasileirão, meu Tricolor estava em 5o lugar na tabela. Agora ele é líder, e cada rodada é decisiva a favor ou contra isso se manter. Mas o Juca Kfouri é meu melhor oráculo futebolístico, e há algum tempo já ele vem anunciando que o campeão desse ano provavelmente tem o uniforme preto, branco, e vermelho. Lotar o Morumbi se torna essencial nessas circunstâncias - e aí eu não consegui meu ingresso para domingão, e tive que assistir o jogo do bar, conhecendo outros são-paulinos frustrados sem seus ingressos. Tudo bem, porque ano que vem viro Sócia Torcedora, pago metade do preço pelo ingresso, pego fila especial, tenho ingresso garantido, e ganho camiseta oficial.
Na F1, tudo mudou em um segundo, uma ultrapassagem, a 100m do final da corrida. Sim, as mudanças do mundo estão assim: na velocidade de um carro de F1.

CRISE
Aqui e lá
Diz o meu chefe: não existe crise para quem transcende.
E, acima da minha tensão com as minhas ações no homebroker, acima do meu reveillon que foi-se embora crise abaixo, acima da ansiedade gerada por uma mudança sem cara e sem previsão, a idéia é transcender nas idéias e nas atitudes e na inovação e nos desafios o que aparece como essa nuvem negra. Para além das notícias de insônia, dos prejuízos espetaculares, do número surreal de desempregados que só tende a aumentar, quem vê realmente além acha, disfarçada pelo medo, a oportunidade.
Boa sorte aos de boa visão é o que eu desejo.
Só aqui
Não sei se o Unibanco estava quebrando, mas de fato tudo leva a crer que essa "fusão" com cara de aquisição é bastante assustadora. Os grandes bancos privados de varejo no Brasil hoje em dia são três, Bradesco, Itaú+Unibanco, Real+Santander. O mercado se concentra, e as opções, assim como a concorrência, diminuem. Não sei fazer uma análise muito afiada dessa estranha "fusão" sem que leia melhor as opiniões sobre o causo - mas posso adiantar que, pro consumidor, será muito pior. E que o contexto no qual essa fusão surge é de levantar todas as suspeitas do mundo sobre a tal "fusão". Tudo indica que os Moreira Salles foram, na verdade, engolidos sem dó pelos Setúbal - informação que nunca a grande imprensa confirmará.

SUPERSTAR
Pois é. Meu dia de ser uma superstar chegou.
Já peguei a toalha suada do Xororó no show dele com o Chitão, no prêmio "pecuária sustentável" (disse meu irmão, sóbrio e certeiro, que isso é uma contradição em termos: pecuária e sustentabilidade não co-existem na mesa frase nunca).
Já representei minha chefe na premiação de uma grande revista de decoração - e devo aparecer na próxima edição da revista em várias fotos ao lado dos vencedores e do editor-chefe da revista.
Vou conhecer o Nobel da Paz Mr. Yunus - aqui, alive, e na minha frente.
E serei apresentadora de um programa sobre SP gravado por uma grande rede de TV internacional.
A conquista do mundo chega quando mesmo?

UM A MAIS
Quando começou esse ano, fiz planos e estipulei metas para coisas que eu gostaria de alcançar (pessoais e profissionais) entre os 25 e os 35. Na minha véspera de fazer 26, entrei em crise de desespero de falta de cumprimento de metas. Daí resolvi jogar todas elas - as metas - pro alto. E foi lindo. Quando metas viram planos, elas ficam mais gostosas - e os 26 anos não pesam tanto nas costas.
Ao mesmo tempo que joguei as metas pro alto, mudei o visu: cortei as madeixas, curtas, mudernas, repicadas, e fiquei um pouco loira, um pouco ruiva, um pouco morena como sempre. Essa mudança de visual, por incrível que pareça, foi uma das coisas mais relevantes do meu dia de aniversário.
Outra coisa: dessa vez não encarnei nenhum personagem: não fui o bêbado bobo da corte do meu próprio aniversário, como que rindo escancaradamente da minha própria tragédia - exatamente como ocorreu ano passado, naquele riso escandaloso e incrivelmente alegre que ecoava pela varanda pequena e lotada. Foi um aniversário menor em tudo, mas menor não de "mais pequeno", e sim de alguma coisa sem excessos.
O mais louco é isso: a pessoa que estou me tornando é exatamente mais humana e menos excessiva do que a pessoa que eu já fui.
Totalmente coerente.

ALGUNS A MENOS
Enquanto o coração vazio permanece, minha vida de outras coisas se enche. E, se eu pego como exemplo minhas amigas que estão com "hómis", vejo que eu não daria conta da metade de tudo isso se eu tivesse um hómi também, e se esse hómi fosse sinônimo de angustia, ansiedade, aflições, isso seria ainda pior.
(Isso tem sido comum para as pessoas que me cercam: infelizmente, todas as minhas amigas que se dizem felizes na vida afetiva, em maior ou menor grau apresentam algum tipo de angústia, de stress. Não sei se são os homens que não estão dando das demandas delas, ou se elas que não estão dando conta de um relacionamento com um pouco menos de demandas.)
Vou conhecer o Sr. Nobel daqui há pouco e já volto - prefiro ficar quieta no meu canto até que nesse canto caibam dois de novo, porque por ora eu sozinha tenho ocupado bastante espaço.
E aí, sei lá quando isso vai ser - conforme a gente apanha, fica gato escaldado, fica coração de pedra, fica mais difícil de se encolher para caber mais um ao lado.

WORK HARD, PARTY HARDER
Em compensação, reinaugurei o perído de muita diversão - seja lá o que isso signifique.
Mesmo que seja só deitar ao sol no Ibirapuera lendo meu Diplô e depois comer creme de abacate. Ou então, que seja me jogar na pista duas noites seguidas, e ficar um pó na 2a. O ponto é que foi reinaugurado o período de muita diversão, ou seja, o "portal da rabugentisse" se fechou ou está se fechando.

DO LADO ESQUERDO DO PEITO
A sensação que eu tenho é que os realmente relevantes permanecem - mesmo que por um tempo eles sumam, mesmo que essa coisa humana de não ficar feliz com a atitude de alguém aconteça, mesmo que problemas de rotina e de tempo impeçam que a gente se encontre, mesmo que quando eu fico chateada com alguém eu tenda a evitar essa pessoa, mesmo que tenha namorado(a) novo(a) no pedaço que impeça que a gente se veja com tamanha frequência, mesmo que tenha algumas horas de vôo nos separando.
O ponto é que os realmente relevantes permanecem.
Então eu rogo: que cada um cuide de fato da sua relevância, e que não se deixe ser levado pela mediocridade - porque para a mediocridade eu não tenho muita tolerância, principalmente quando uma pessoa que não é medíocre se torna medíocre.

4.10.08

Exercendo a cidadania (e a civilidade?)

Hoje cheguei em casa e perguntei pro meu pai: " e aí, tá pronto para exercer sua civilidade e sua cidadania amanhã?". Ele, fofo que é, me mostrou meio orgulhoso a "cola" que ele tinha feito pelo UOL: ele digitou o nome dos candidatos dele, e imprimiu o que o UOl chama de COLA UOL Eleições 2008.

Daí ele me devolveu a pergunta: "já escolheu seus candidatos? Já separou seu título?". Bom, o título eu pego amanhã, porque ele está aqui na gaveta ao lado.

Eleições brasileiras são um acontecimento estranho. Bastante ufanista. Horário eleitoral é uma bizarrisse sem fim - mas bem que eu queria assistir o horário eleitoral para a prefeitura de Japarantinga, por exemplo. Se bobear eu daria mais risada do que dou com o CQC - mas não perco por nada o CQC de segunda, especial das eleições.

Voltando... não sei se a nossa democracia funciona, mesmo. Pelo menos não desse jeito, com zero de accountability, com políticos que se repetem, com projetos que não mudam nunca (fora a Marta querendo fazer de São Paulo inteira uma cidade wireless - parabéns, hein, dona Marta?), com todo um esquema underground de corrupção que às vezes vem à tona (só a pontinha do iceberg, sempre) e que permeia absolutamente todo o sistema político brasileiro.

Pois é. Lá no trabalho brincam comigo que eu sou a personificação da crença em um mundo melhor. Em eleições para mim não existe tal mundo. Pelo menos não aqui em São Paulo - e não sei se em algum município do Brasil.

Já fiz aula disso na faculdade, política, sistemas políticos, e se eu lesse mais um pouco do Bobbio eu poderia fundamentar melhor, de maneira quase acadêmica, minha não crença na política do Brasil para os próximos tempos, e minha não crença nessa democracia de faixada aqui estabelecida. De qualquer forma isso aqui não é conversa de bar, e sim monólogo de blog, então meus devaneios são puro senso comum bastante preguiçoso de se embasar melhor.

Hoje perguntei para a Cidoca e para as cabeleleiras quem é o prefeito delas. Todas responderam Alckmin, e na minha humilde opinião isso é simplesmente uma influência bem exercida pelas clientes e patroas. E quando elas devolviam para mim e eu respondia que vou anular, o rosto delas se escurecia, como que afogado em uma decepção infinita. Com alguns cinco minutos de prosa, explicando de maneira didática a minha escolha, algumas entendiam e outras continuavam sem entender.

De qualquer forma, o ponto é que anularei como forma de protesto. E se antes eu pensava em dar um voto útil para a Marta, anti Kassab ou anti Alckmin, hoje eu sei que não darei, e que anularei nos dois turnos. Isso para mim pode ser meu não-exercício de cidadania, mas um sim para o exercício de civilidade. Me negar em dar um voto de credibilidade às opções que estão aí é meu jeito de ser um pouco mais civilizada em um país de puro amadorismo político e democrático.

Mesmo assim eu gosto desse fuzuê político, pesquisas Ibope e Datafolha, pessoas discutindo política e voto. Gosto disso por parte, sempre, dos cidadãos, e nunca dos políticos. Da mesma forma, e isso também é por parte dos cidadãos, fico com um grande pé atrás quando o exercício da democracia beira uma grande festa eufórica.

Mas sobre democracia e festa eufórica falo outro dia. Antes desse outro dia chegar, recomendo "O Espetáculo Democrático", de 2003, dirigido por Guilherme César. É rapidinho: tem 40mins. E ele faz bem isso: a partir da euforia reinante entre os cidadãos e eleitores brasileiros quando da eleição do Lula em 2003, ele faz uma bela crítica ao nosso sistema. Tomei conhecimento tardio desse documentário quando estive, nesse agosto, na sessão temática "Se as eleições pudessem mudar, há muito teriam sido proibidas", dentro da Mostra "Cartas brancas ao submarino vermelho", dentro da Mostra Internacional de Curtas de São Paulo. Meu conhecimento tardio desse documentário não funciona como um impeditivo para que eu recomende fortemente esse documentário, e assim o faço aqui: assistam "O Espetáculo Democrático".

29.9.08

Sobre Nós

OU: como uma pessoa que tem praticado a "tolerância zero social" vê um evento tal qual o About Us.


Introdução - sobre o conceito de Tolerância Zero Social
Posso resumir esse conceito em algumas linhas apenas, e quem me conhece sabe que eu sou um pouco rabugenta com isso mesmo. Mas a idéia é basicamente que hoje em dia, e cada vez mais conforme os dias passam, meu tempo livre virou um dos meus ativos mais raros. Partindo desse pressuposto, entende-se que estou cada vez com menos paciência com as pessoas que me cansam de alguma forma (por mais subjetivo que isso possa ser, mas não ficarei explicando esse conceito porque ele diz unica e exclusivamente à minha pessoa). Enfim, "tolerância zero social" diz respeito a tempo escasso e a saber como gastar esse tempo, e diz respeito também a uma impaciência crônica e perturbadora com relação às pessoas, atitudes, opiniões e demandas sociais que me cansam. E aí tenho me afastado e me aproximado de pessoas ciclicamente, e sentido saudades fortíssimas de algumas pessoas e uma rejeição inédita com relação a outras pessoas.


Sobre o About Us
Divido facilmente o festival em três partes, que não são totalmente separáveis entre si afinal dizem respeito ao mesmo festival, e ao mesmo tempo podem ser separadas para dar uma amenizada na rabugentisse social que me acomete.

Parte 1: Musical
Cheguei para o show da Vanessa da Matta (ponto alto, "História de uma gata") e saí após o Dave Matthews acabar seu show de quase duas horas e meia. Ben Harper e Dave Matthews fizeram dois shows não burocráticos e bem curtidos. Na verdade, tudo o que eu queria era isso: ver a festa no palco que Dave e seu bando fazem, a delícia do improviso, do instrumental prolongado, dessa mistura de um pouco de tudo, folk, country, rock, tudo isso com muito sopro e muita percursão. Antológica foi a visita que o Ben fez ao Dave no palco; e apenas um pouco melhor do que apenas para cumprir tabela, a visita que a Vanessa da Matta fez ao Ben. Voltando à festa no palco, no gramado a festa refletia em nós, que dançávamos sem jeito e um pouco bobos de alegria de ver aquele espetáculo orquestrado pelo cara simpático e de voz rouca. Ele disse: "it is overwhelming to be here" e eu, que estava brincando de tradução simultânea, disse: "estou extasiado de estar aqui". E aí "extasiado" virou nossa palavra oficial do show.
Se eu fosse alguém com poder de avaliação, eu daria nota: +++

Parte 2: Sustentável
Juro que eu queria que a parte sustentável do show desse certo e fosse um sucesso. Mas seria uma falácia falar que foi. Triste isso. Iniciativas bacanas na entrada do show eram simplesmente ignoradas pelo público que usava essa área simplesmente como passagem. Tendas vendendo produtos "About us" estavam em todos os lugares - tinha mais dessas tendas do que lanchonete vendendo comida, por exemplo. Aí a gente pára e pensa: os bróders que organizaram esse show se esqueceram que o consumo e a conscientização do consumo também faz parte da criação da sustentabilidade. Eles também se esqueceram que há lugares e lugares: em um festival de dia inteiro, comida orgânica e integral a preço de ouro não é o que o público (que já pagou caro pelo ingresso, diga-se de passagem) quer comer. Se a sustentabilidade, portanto, estava nas comidas e nas iniciativas bacana, esqueça dela. Porque ninguém viu, ninguém notou, ninguém nada - muito pelo contrário: da comida, as pessoas até reclamaram. Mas, veja só você, a sustentabilidade também estava nos telões do palco, com depoimentos de gente famosa pela fama (Ciça Guimarães, Global) e gente famosa pelo mérito (Carlos Minc, Ministro do Meio Ambiente). Grande ironia essa: era no intervalo dos shows, e ninguém estava nem aí para o que passava no telão. Quem poderia ter ajudado alguma coisa com relação à sustentabilidade, os artistas que subiram ao palco, de fato não ajudaram, porque ninguém disse nada sobre sustentabilidade. Agora entrando em ação a versão mais chata de mim mesma (a versão da politicamente correta), outro ponto de crítica: no mundo em que eu vivo ainda não inventaram cadeira de rodas off road. Não é à toa que eu não vi nenhum cadeirante nesse evento: o acesso era simplesmente impossível.
Se sustentabilidade é pluralidade eu dou nota: --

Parte 3: Público.
Era mais ou menos assim: 50% do público tinha de 15 a 25 anos, e outros 50%, de 25 a 35 anos. Outra divisão possível é que 50% estava lá porque gosta do som dos caras, e queria ouvir boa música, bom som, se divertir.
E os outros 50% estavam lá "pagando de gatinhos", totalmente "cool wannabe", simplesmente por ser um festival amplamente divulgado e com atrações cujas músicas essas pessoas conheciam no máximo duas ou três. Essa galera que estava lá pagando de gatinho era constituída por meninas maquiadas (mesmo no esquema off road, por mais contraditório que pareça), com base, rímel, lápis, gloss (urgh, eu odeio gloss em mim e um pouco mais ainda odeio gloss nos outros) e shortinhos ou sainhas e muitas vezes blusinhas decotadas de viscolycra com algum modelo bacaninha (congelando de verdade naquele frio outonal que fez naquela tarde); e meninos com tênis, bonés, calças jeans, de marcas bacaninhas e famosinhas. Todos assim, lá nesse show muito pelo hype que rolou em torno dele, sem entender ao certo o que estavam fazendo lá, mas sabendo muito bem que era legal o fato de eles estarem lá. Um amigo meu, jornalista de um veículo de imprensa de grande circulação que esteve no evento para fazer a cobertura, em um desabafo via msn disse o seguinte:
"Bom, "fãs" no sentido estrito da palavra (gente que conhece discografia, letra de música, acompanha há tempos etc.), sempre são poucos. Tirando, é claro, as megabandas, o que não era o caso ontem. Ou seja, em qualquer show, a maior parte do público não é exatamente de "fãs" (salvo casos atípicos como o Los Hermanos), mas de gente que conhece os sucessos e gosta. E esse me parecia ser exatamente o tipo de gente que estava lá ontem. Não foi gente que foi só pra ver - neguinho conhecia os sucessos do Ben Harper e da DMB - não sabiam cantar, não sabiam os nomes das músicas, não sabiam mais nada, mas sabiam que já tinham ouvido. Ouvi muito "ah, é essa". Você não achou que Dave Matthews e Ben Harper iam atrair um público indie, né? Era aquilo ali, aquele pessoal da firma."
Então é um pouco isso: pessoas que estavam lá pelo hype, no melhor dos esquema "pagando de gatinho", "cool wannabe", "pessoal da firma".
Se eu não tivesse telhado de vidro eu daria nota: -----------

De uma forma ou de outra, posso estar rabugenta mas não serei injusta.
Os shows do Ben Harper e do Dave Matthews compensaram o trânsito na chegada e a fila de uma hora e meia para sair do estacionamento no final; compensaram os 50% deprimentes do público bizarro; compensaram essa hipocrisia retórica da sustentabilidade no evento, com um palco gastando sei lá quantos milhares de energia elétrica e emitindo uma quantidade absurda de CO2 na atmosfera (porque até onde eu me lembre o intuito era neutralizar as emissões de carbono).

E tenho dito.

18.9.08

Dados de Ontem

Temperatura do dia
13 graus na Paulista, na hora que eu saí do trabalho.

A Bolsa no dia
Queda de 6,7%.

Momento do dia
Dançar com o véu que voa na aula de dança.

Piada do dia
Maluf diz, na Sabatina da Folha, que só sai da política quando for pro céu.

Frase do dia
Ao comer alcachofra no jantar: "Comer alcachofra e não comer o fundo dela (ou o "coração", como preferir) é a mesma coisa que sexo sem orgasmo."

16.9.08

Have a nice day!

Ou: começando bem a semana.

Pois é. Tudo que a gente precisa é realmente muito pouco.

E aí ontem eu:

1- tomei café da manhã com o pessoal do trampo.

2- desci para almoçar em casa.

3- fiquei feliz com o tempo frio reinante em São Paulo.

4- falei via msn com a amiga italiana de quem eu morro de saudades.

5- retomei contato com pessoas bacanas da pós-graduação - contato retomado de um tanto que já marcamos a happy hour.

6- falei via skype com a amiga de Nova York de quem eu morro de saudades absurdamente.

7- fechei minha noite ouvindo o Henrique Meirelles soltar pataquadas no Jornal da Globo.

(sobre o Meirelles, a crise, e o subprime, depois eu falo)

O ponto é: uma semana que começa assim não tem muito como dar errado.

15.9.08

"Amanhã é domingo, menina...

Ninguém vai te acordar. Deixa chover na esquina, deixa a vida rolar..."

Sábado à noite fui dormir cantarolando essa música.

Tinha sido um sábado do tamanho e do jeito que eu precisava que ele fosse... Sexta à noite a frente fria chegava e eu estava no teatro dando risada e depois na lanchonete comendo um bom hamburger e ficando um pouco assustada com a mediocridade à qual certas pessoas podem se submeter eventualmente. Sábado ao acordar eu tinha dormido tão bem que as olheiras estavam significativamente menores. E aí eu fui ao cabeleleiro, deixar o cabelo macio, e como um passe de mágica, ele ficou mais macio mesmo. Depois, festa de família. Mas aniversário de criança é uma festa de família naturalmente mais feliz do que as outras... ainda mais de um menino tão simpático e tão legal quanto ele, e que mora longe, e que fala (desde os dois anos de idade) com sutaque nórdeshtino: "Pegue o balão para mim, pegue". E meus pais deitavam e rolavam com o sobrinho-neto deles de um jeito tão lindo, que os olhares e os sorrisos pediam netos para mim e pro meu irmão. Pediam de um tanto que o resto da família toda reparou e enxeram nosso saco, que já está na hora de nos ajeitarmos nessa vida, porque nossos pais querem netos. Depois eu fui para a casa da amiga boa, ter conversa boa, com um amigo gente boa, deitados em almofadas boas, ouvindo músicas boas, tendo boas viagens e devaneios coletivos em três. E aí comemos "ovo mexido gourmetado". Voltei para casa feliz da vida - feliz com tão pouco, mas muito feliz mesmo.

Então eu cheguei em casa, me arrumei para ir dormir, e deitei na cama. E assim que eu deitei na cama, comecei a ouvir os pingos de chuva lá fora. E aí comecei a cantar. "Minas com Bahia", música gostosa de dueto de Samuel Rosa e Daniela Mercury.

Sempre gostei dessa música, e gosto dela mais ainda desde que descobri mesmo que Minas e Bahia são dois estados desse Brasil que me são muito muito muito queridos. As pessoas, os lugares, as músicas, os cheiros, as comidas, as paisagens. Tudo isso em cada um desses estados me é muito querido.

E a frase "amanhã é domingo, menina / ninguém vai te acordar / deixa chover na esquina / deixa a vida rolar" é fantástica para um sábado à noite chuvoso, prenúncio de um domingo chuvoso.

13.9.08

O romantismo segundo Frejat

Tudo bem que tem o jabá e todas aquelas outras coisas que a gente já sabe que contam muito mais para uma música tocar sem parar nas rádios, para além do simples critério “mérito”. Mas o fato é que quando eu gosto da música, fico feliz que ela toque sem parar. E hoje ela tocou na minha “uma hora de limbo” de todas as manhãs.

(Parágrafo gigantesco para explicar a “uma hora de limbo”: essa é aquela exata uma hora em que a Cidoca já entrou no quarto para me acordar; que a persiana já está levantada e a luz do sol já bate na janela vizinha e reflete justo no meu quarto; e que o despertador (com música) já foi disparado; mas que mesmo com tudo isso eu fico localizada exatamente na tênue realidade paralela do limbo entre o sonhar acordada e dormir profundamente (fase REM do sono), e entre o olho aberto e o olho fechado, quando tudo fica simplesmente em um meio-termo muito abstrato.)

A música que tocou na minha “uma hora de limbo” é a nova do Frejat, que está tocando bastante e em várias rádios (já ouvi na Nova Brasil, Brasil 2.000, Eldorado, Mitsubishi, etc). E sempre que eu ouvia essa música eu ficava feliz... mas hoje, que eu acordei ouvindo ela, grudou na cabeça e eu estou o dia inteiro cantarolando “vou começar pedindo a sua mão...”

A letra dela é bem parecida com a letra de “Por você”, é um romance lindo vivido por duas pessoas normais e bem de carne e osso. Não tem o drama das sertanejas, nem o grude brega do amor pagodeiro. Não tem o lirismo do Vinícius, e nem as idealizações e metáforas lindas do Tom. E nem a responsabilidade de ser um “amor único” como em “My first, my last, my everything” do Barry White. Não tem toda a poesia baiana e meio cosmopolita e meio hippie do amor da Tropicália. Também não tem todo o sofrimento e o auto-esquartejamento promovido pelo drama acentuado da esparrela da soprano de quinta. E também não é a invenção de uma mulher - a Penny Lane - pelos Beatles.

O romantismo do Frejat me faz os olhos brilharem. É o amor possível dos dias de hoje. É um pouco um amor do Cazuza. Só que é um romantismo mais bem-humorado do que o do Cazuza, e nem por isso leviano. Mas com certeza, mais leve. E mais contemporâneo também.

Pôxa, o Frejat dormiria de meia para virar burguês. Ele limparia os trilhos do metrô, e iria a pé do Rio a Salvador. Ele quer uma mulher normal do povo, e não uma mulher global de novo. Ele quer uma mulher que o ame no Natal e no Ano Novo.

É isso, é um romantismo gostoso, é uma declaração de amor que poderia muito bem fazer parte da vida de qualquer um de nós. É muito mais real que uma poesia – e não deixa de ser poético, mas para além da poesia por si só, é uma poesia assim, humana, atingível, plausível. É o amor que não só sonha – mas que vive a realidade e que é feliz exatamente pela possibilidade de vivenciar essa coisa gostosa.

Na verdade, sei lá.

Acho que estou assim, um pouco frejatiana, depois de ter apanhado bastante do amor sonhador ao longo da vida. E depois do ápice desse ano (queda dura de altura alta caída duas vezes, quase que uma morte morrida das minhas idéias românticas), hoje em dia consigo usar todas as máscaras junguianas menos a da “romântica sonhadora” – e muito por isso eu estou tão sozinha que absolutamente nenhuma pessoa ocupa meus pensamentos e meus sonhos – coisa que nunca deve ter acontecido antes na minha vida. Estou navegando em mares nunca dantes navegados – e sim, isso é delicioso.

Percebendo que aquele amor da “romântica sonhadora” que ouvia Vinícius ("você quer ser minha namorada?") e divagava, que ouvia Chico ("amo tanto e de tanto amar...") e sonhava acordada, amor esse tão cheio de lacunas geradas pelo excesso de expectativas, amor esse tão sozinho – eu, enamorada por alguém que era um habitante do meu imaginário (com todas as distorções da realidade que isso possa incluir), no final das contas nunca deixei de ser uma linda e sorridente solitária.

Não é mais esse o amor que eu quero para mim. O que eu quero é o amor que habita muito mais o meu dia-a-dia do que ele habita o meu imaginário (e isso nunca aconteceu antes na minha vida).

E é exatamente por isso que fico tão feliz cantarolando o amor frejatiano para cima e para baixo em plena sexta feira ensolarada – mesmo que a priori eu nunca tenha vivenciado de verdade o que seja isso.

Coloco aqui as letras das músicas, para quem não sabe do que eu estou falando.

Eu Não Quero Brigar Mais Não
Eu amo o cheiro do seu cabelo
Eu amo o nosso amor assim
Sem dor de cotovelo
Vamos pra bem longe daqui
O vira-lata e a gata
Meu bem
Pode levar o novelo
O nosso amor não é só de pele
E de pêlo
Se quiser ter um neném
Tudo bem, vamos tê-lo
O nosso amor vai da água pro vinho
Às vezes é feito baixinho
Às vezes acorda o vizinho
Penso em você
O meu coração se aquece
Penso em nós dois
E as peripécias da espécie
Esquece a nossa última briga
Lembra o primeiro beijo
E ouça essa cantiga
Eu não quero brigar mais não
Eu quero você toda pra mim
Vou começar pedindo a tua mão
Você é aquela que o meu coração habita
Única e favorita
Estrela da minha vida
E da minha escrita
Eu fico sorrindo de orelha a orelha
Você com a pele bonita
Que fica sempre vermelha
Quando eu te amo de forma infinita
Somos Bambam e Pedrita
Eu não quero brigar mais não
Eu quero você toda pra mim
Vou começar pedindo a tua mão
Eu quero uma mulher normal
Do povo
Não quero uma mulher global
De novo
Quero uma mulher que me ame no Natal
E no Ano Novo
Amor no caviar
No pão com ovo
Namoro num Fusquinha ou num Volvo
Quero uma mulher que me ame no Natal
E no Ano Novo
Eu não quero brigar mais não
Eu quero você toda pra mim
Vou começar pedindo a tua mão

Por Você
Por você eu dançaria tango no teto,
Eu limparia os trilhos do metrô,
Eu iria a pé do Rio a Salvador...
Eu aceitaria a vida como ela é,
Viajaria a prazo pro inferno,
Eu tomaria banho gelado no inverno.
Por você...
Eu deixaria de beber,
Por você...
Eu ficaria rico num mês,
Eu dormiria de meia pra virar burguês.
Eu mudaria até o meu nome,
Eu viveria em greve de fome,
Desejaria todo o dia a mesma mulher...
Por você...
Por você,
Conseguiria até ficar alegre,
Pintaria todo o céu de vermelho,
Eu teria mais herdeiros que um coelho.
Eu aceitaria a vida como ela é,
Viajaria à prazo pro inferno,
Eu tomaria banho gelado no inverno.
Eu mudaria até o meu nome,
Eu viveria em greve de fome,
Desejaria todo o dia a mesma mulher.

8.9.08

Y-O-G-A

(pronunciado pausadamente, como quem respira, expira, inspira, lentamente, respeitando o ritmo do próprio corpo e não o ritmo imposto por conjunturas externas à nós)

Fiquei duas semanas sem ir à Yoga. Hoje quando saí do trabalho às sete e meia da noite estava me sentindo uma super revoltada ultra revolucionária com um rompante de indisciplina radical que joga a toalha e vai embora, esquecendo o Inbox abarrotado, e corre para a yoga.
A ironia fina é importante de ser destacada: revolta, revolução e indisciplina não há nenhuma quando já são 19.30 e você ainda está no trabalho. Não, eu não fui displicente com meus compromissos profissionais - embora a priori fosse assim que eu me sentisse. E é nessa contradição (realidade/sensação) que reside a ironia fina. E também nos termos usados para descrever essa sensação: rompante de indisciplina radical pode ser um bom exemplo disso.

OK.
Continuemos sem mais metalinguísticas-dialéticas-auto-explicativas.

Voltando ao ponto onde interesse: larguei lá o Inbox abarrotado e desci a mil por hora, vento gelado no rosto, para a yoga. Fiquei duas semanas sem ir à yoga - meu corpo já gritava: yoga, yoga, yoga, yoga, um gritinho assim, exaurido e abafado ao mesmo tempo. Gritinho de ombro duro, de lombar gritando, de canela dolorida, de pescoço travado. Eu posso não conseguir ir à yoga com a boa e velha frequência de sempre desse primeiro semestre de 2008 - 3 ou 4 vezes por semana. Posso me esforçar em excesso para ir duas vezes por semana, ao sair do trabalho. Mas, pôxa vida, ficar 15 dias sem yoga é displicência demais comigo mesma!

Cheguei em casa, tirei correndo a roupa do trabalho, coloquei correndo a roupa da yoga (ah, como eu gosto de Crocs nos meus pés) e me joguei na cama estatelada (aquela cena de filme que a pessoa senta na beira da cama, coloca o sapato, e dá aquela oscilada antes de partir para a próxima: deita e fica vendo a luz do quarto no teto, admirando o nada, e tomando coragem).

Contra tudo e contra todos, a favor dos gritinhos abafados que meu corpo tem dado ultimamente, fui. E a uma hora e meia da yoga de hoje (obrigada, Marcella, professora, mestra e amiga!) foi o suficiente para que eu começasse nova uma nova semana. É engraçado isso, o corpo pedia taaanto a yoga nos últimos tempos, que para além de todas as "posições mágicas" que tenho conseguido fazer após esse um ano praticando (sim, essa semana comemoro um ano de aniversário de Mariana-yogi), hoje fiz as posições mágicas e me estiquei muito, muito muito.

Saí de lá com um trato, um trato quieto e silencioso, mas que eu coloco aqui para depois eu não me trair - e ter testemunhas: Mariana - a pessoa vs. Mariana - o corpo.

Meu trato é:
te prometo, ó corpinho de gritos abafados, que vou à yoga no mínimo duas vezes por semana. Te prometo, ó corpinho, que a acupuntura será quinzenal. Te prometo, ó corpinho, que me esforçarei ao máximo para que você não pague mico na dança. Te prometo, ó corpinho, que vou dormir mais cedo e não acordar mais tão atrasada.

Rolling Stones já cantou: you cant' always have what you want. Eu estou devidamente mergulhada na eterna luta entre o tempo que eu cuido de mim e o tempo que eu cuido do meu trabalho.

Anyways, não queria perder tanto o foco assim. Quando li Comer, Rezar, Amar, a moça do livro foi praticar yoga e meditação em um ashram da India. E o que ela escreve sobre a importância da yoga na vida dela é tão lindo e é tão eu, que eu tomo a liberdade de reproduzir por aqui.

Esse era meu foco inicial (mas eu sou uma pessoa que me perco em meus pensamentos e em minhas idéias mesmo quando estou escrevendo): simplesmente falar como a yoga do dia de hoje mudou radicalmente a minha vida, e como o que a Liz Gilbert (do Comer, Rezar, Amar) escreveu sobre a prática da yoga é exatamente, literalmente, coincidente com o que eu penso da yoga.

Yoga, em sânscrito, pode ser traduzido como união. A origem da palavra é o radical yuj, que significa algo como dedicar-se a uma tarefa com a disciplina de um boi. A tarefa do ioga é encontrar a união - entre mente e corpo, entre indivíduo e o seu Deus, entre nossos pensamentos e a origem de nossos pensamentos, entre professor e aluno, e até mesmo entre nós e nossos semelhantes às vezes tão pouco flexíveis.
Ioga pode também significar tentar encontrar Deus por meio de meditação, por meio do estudo erudito, por meio da prática do silêncio, por meio do serviço de devoção, ou por meio de um mantra - a repetição de palavras sagradas em sânscrito.
O caminho do ioga consiste em desatar os nós inerentes à condição humana, algo que definirei aqui, de forma extremamente simplificada, como a desoladora incapacidade de sustentar o contentamento. Ao longo dos séculos, diferentes escolas de pensamento encontraram várias explicações para o estado de aparente falha inerente ao ser humano. Os Taoístas chamam-no de desequilíbrio, o Budismo, de ignorânciam o Islamismo põe a culpa de nosso pesar na rebelião contra Deus e a tradição Judaico-Cristã atribui todo nosso sofrimento ao pecado original. Os freudianos afirmam que a infelicidade é o resultado inevitável de um embate entre nossas pulsões naturais e as necessidades da civilização. Os iogues, no entanto, dizem que o descontentamento humano é um simples caso de identidade equivocada. Nós somos infelizes porque achamos que somos meros indivíduos, sozinhos com nossos medos e falhas, com nosso ressentimento e nossa mortalidade. Acreditamos equivocadamente que nossos pequenos e limitados egos constituem toda nossa natureza. Não conseguimos reconhecer nossa natureza divina mais profunda. Não percebemos que, em algum lugar dentro de todos nós, existe um EU SUPREMO que está eternamente em paz. Esse EU SUPREMO é a nossa verdadeira identidade, universal e divina. Se você não perceber essa verdade, dizem os iogues, estará sempre desesperado, idéia expressa de forma inteligente na seguinte frase irritada do filósofo estóico grego Epítero: ”Você leva Deus dentro de si, seu pobre desgraçado, e não sabe disso!”
Ioga é o esforço que uma pessoa faz para vivenciar pessoalmente a sua divindade, e em seguida para sustentar essa experiência para sempre. Ioga é o domínio de si e o esforço dedicado a desviar a atenção de reflexões intermináveis sobre o passado e preocupações infindáveis com o futuro para, em vez disso, conseguir buscar um lugar de eterna presença, de onde se possa olhar com tranqüilidade para si emso e paro o mundo ao redor. Somente dessa perspectiva de equilíbrio da mente é que a verdadeira natureza do mundo (e de você prórpio) lhe será revelada. Os verdadeiros iogues, de sua posição de equanimidade, vêem este mundo todo como a mesma manisfestação de energia criativa de Deus - homens, mulheres, crianças, nabos, piolhos, corais: tudo isso é Deus disfarçado. Mas os iogues acreditam que a vida humana, e somente com uma mente humana, é que a percepção de Deus pode ocorrer. Os nabos, os piolhos, os corais - eles nunca tem a oportunidade de descobrir quem realmente são. Nós temos essa oportunidade.
Nosso propósito nesta vida, portanto - escreveu Santo Agostinho, ele próprio um pouco iogue - é 'recuperar a saúde do olho do coração através do qual podemos ver Deus'.”
(”Comer Rezar Amar” de Elizabeth Gilbert/ editora Objetiva)

Só uma observação final: contraditória é uma pessoa que, por uma hora e meia - e apenas duas horas e meia atrás - vivencia o aquietamento profundo da mente e sua admiração diante do Sagrado - ali, tão próximo, tão dentro - e mesmo assim continua com o pensamento tão viajante que dá mil voltas em post para escrever o que eu queria ter escrito in the very first place.

Boa noite para vocês também - que ficar sem dormir, eu acho, tem-me feito mal, muito mal.

26.8.08

Sonoridades

Por falar em ler e repetir (ler post abaixo), tenho duas observações engraçadas para fazer sobre essas coisas um pouco fonéticas.

A primeira delas é deveras bizarra, na verdade.

Tudo bem, talvez meu sobrenome não seja dos mais fáceis do mundo. Mas sexta passada, na entrada de uma empresa, entreguei meu RG pro segurança da empresa e ele me devolveu o RG com a seguinte frase: "Senhora, peço desculpas mas eu não consigo entender seu sobrenome. A senhora poderia por favor ditar o que está escrito aí?"
Por dentro, minha vontade de dar risada era proporcional à dó que eu sentia do cara... porque afinal, teoricamente é bem mais fácil o bróder ver o que está escrito no meu RG e copiar do que pedir para que eu dite exatamente o que está no RG.

A segunda delas poderia ser definida como absolutamente irritante.

Hoje fomos almoçar na Casa do Pão de Queijo, que está fazendo uma campanha de uma criação de uns pãezinhos de queijo que cada um coloca os recheios manualmente. Essa "técnica" se chama Dip Nic. Fiquei repetindo incessantemente: dip nic dip nic dip nic dip nic dip nic dip nic e as pessoas que me acompanhavam pediram que eu parasse, porque estava irritando. E eu lá: dip nic dip nic dip nic dip nic dip nic. Daí eu falei: querem que eu troque? Tudo bem, eu troco. E me lembrei de Kobe Beef, cuja sonoridade eu também adoro. E fiquei oscilando: dip nic kobe beef dip nic kobe beef dip nic kobe beef dip nic kobe beef.

Fim.

Ethics

Dia desses recebi um poema muito lindo de uma amiga. Ela estava em uma palestra do Oscar Motomura, e ele leu esse poema para o público da palestra.
Reproduzo o poema aqui, com grifos meus, porque tocou fundo para caramba.
Espero que, no mínimo, ele faça pensar (mesmo que não toque assim, fundo).

Ethics
Reflections on ethics and the process of making things happen.

If ethics is the choice for the common good
- deciding not to act because it is difficult and there are uncertaintities involved... is not ethical;
- deciding to act small because it is more confortable... is not ethical;
- deciding to hold back (your proposals, ideas and actions) because you don't want to go against "the group"... is not ethical;
- deciding to doing the possible instead of trying to making the impossible possible... is not ethical;
- deciding to use just a part of your potencial (to save it for self-interested purposes)... is not ethical;
- deciding not to persist up to the limits of your forces... is not ethical;
- deciding to conform to existing limitations (even the ones in the form of inadequate laws)... is not ethical;
- deciding not to act, to stay in silence, letting fear stay in the way... is not ethical;
- deciding to conform to the "letter of the law" instead of persisting on the path difined by the "spirit of law"... is not ethical;
- deciding to "delegate" your natural power, as a world citizen, to others... is not ethical;
- deciding not to try because nobody tried it before... is not ethical;
- deciding not to act on challenges of scale and complexity because they look overwhelming... is not ethical;
- deciding not to pursue the pefection and conform to what seems "negotioable"... is not ethical;
- deciding to postpone bold actions again and again "waiting for the right moment"... is not ethical;
- deciding not to act pressed by the convetions established by your own "professional community"... is not ethical;
- deciding to hold back because you may not be recognized as the author of the solution... is not ethical;
- deciding to "play the game" and pretend that you are not seeing the manipulations underway... is not ethical;
- deciding to live the realm of ideas, diagnosis and theories instead of taking the riscks and going for action... is not ethical;
- deciding to act only when all is scientifically proven, even when the truth is self evident... is not ethical;
- deciding to reject all radically creative ideas (yours including) when the "traditional-not-so-radical ideas" have not been working... is not ethical;
- deciding not to act because the process of reaching the perfect solution is too complex and difficult to implement... is not ethical;
- deciding to reject every proposal that looks "idealistic" or "uthopic"... is not ethical.

(Insights of Oscar Motomura during Tallberg concert that followed the session of Moral Boundaries Workshop, Summer of 2008)

Uma observação especial: com relação à frase
- deciding to postpone bold actions again and again "waiting for the right moment"... is not ethical;
hoje, em uma reunião interna de trabalho, discutimos isso. E chegamos à conclusão que a hora certa é a hora que decidimos que seja a hora certa. Estamos com uma demanda de trabalhos e projetos absolutamente sem noção, que ninguém está realmente dando conta, mesmo que estejamos todos trabalhando em grupo e com uma super sinergia.
De qualquer forma, decidimos nomear esse nosso momento como "vamoaíedepoisagentevêcomofaz", desse jeito mesmo, tudo junto - porque nem tempo de respirar dá.
Depois disso, vi que a vida é inteira assim. A gente nunca, a não ser que mate no peito e compre a briga, tem o esqueminha para falar que "essa não é a hora certa então deixa para lá". A não ser no mundo dos medíocres, dos patéticos, e dos tacanhos, isso não existe.
No mundo que eu estou tentando construir e fazer parte (aquela boa e velha história de sermos a mudança que queremos ver no mundo), não temos tempo nem opção para ficar escolhendo muito. É tudo nessa base: "vamoaíquedepoisagentevêcomofaz". Mesmo que sem fôlego, mesmo que não seja fácil.
Ou seja, mata no peito, compra a briga, pega o jacaré mergulhando de cabeça. Se eu pudesse dar conselho para alguém hoje em dia, seria isso.
Óbvio que tem toda uma questão de estabelecer prioridades e de entendermos o que realmente é um "chamado", ou o que realmente é uma "balada" - e qual dos dois a prioridade será dada. Mas sobre prioridades, baladas, chamados, escrevo outro dia.
Por hoje, gostaria que todo mundo lesse isso e repetisse: "vamoaíquedepoisagentevêcomofaz".

21.8.08

Rótulos

"Pessoas não são embalagens", já dizia um mendigo com quem cruzei outro dia na rua. Ele gritava isso aos quatro cantos quando chamaram ele de mendigo e ele ficou reclamando do ato de rotular pessoas. Tenho um especial apreço por moradores de rua, herança de quando eu trabalhava em uma ONG que cuidava deles, e esse apreço é mais especial ainda quando se trata de moradores de rua filósofos. Isso é acentuado ainda mais quando se trata de uma pessoa (como eu) que tem por hábito ter small chats sem muita necessidade de um mote introdutório. E pode ser piorado agora que vivo de andar a pé - porque as interações aumentam potencialmente quando seus pés são seu meio de transporte único. Pois bem. Não é da minha conversa com o morador de rua que vou falar hoje.


Hoje conversei com um amigo que me disse que eu era uma "aventureira inspiradora", porque viajei sozinha de mochila por um mês, e porque tinha decidido mudar minha trajetória profissional no final do ano passado. E quando ele me disse isso, eu fiquei pensando como é engraçado as imagens que as pessoas têm da gente, e que muitas vezes não têm nada a ver com a forma com a qual a gente realmente se vê.


E daí comecei a pensar em tudo que já ouvi das pessoas com relação à minha pessoa. Foi uma viagem deliciosa.


Minha avó me chama de "neta mais velha", e isso eu realmente sou - com o detalhe que ela enche a boca e os olhos de orgulho na hora de falar isso.
A sociedade de Foz do Iguaçu, na figura do irmão do amigo do amigo, disse de mim "uma aberração" - porque eu viajei quatro dias sozinha com um amigo que não era meu namorado, dividindo quarto e cama com ele em um hotel (mesmo que isso não tenha significado nada a mais além da nossa amizade), deixando um affair sozinho aqui em São Paulo (e me ligando desesperadamente todos os dias da viagem).
Minha amiga de infância diz que eu sou "uma das pessoas mais cultas" que ela conhece, no que eu tendo a discordar fortemente, sem falsa modéstia.
Meus ex-co-workers me chamavam de "Pelotita de Fuego" (como um rótulo e não como um apelido), pelas bagunças e risadas e happy hours.
Meus companheiros de trabalho atuais (e olha que só faz quinze dias) dizem que eu tenho "um parafuso a menos" (e eu acho cedo demais para eles saírem por aí falando isso).
Meu irmão diz que eu sou uma "patricinha tucana hipócrita". O lance é que ele não verbaliza isso nunca - mas diz em olhares e em atitudes de repreensão.
Meu professor de yoga fala que eu sou "serelepe demais da conta". Porque, óbvio, nunca cheguei muito perto do desapego.
Um disse outro dia que eu sou uma "Amélia com conteúdo", e outro dizia em um passado não distante mas muito remoto que eu sou "uma vanguardista independente que eu não sei se sei bancar". Não soube mesmo.
Minha mãe adora falar que eu sou "a pessoas mais bagunceira do mundo". Eu concordo até o bagunceira, já o do mundo eu não concordo não.
Minha terapeuta não me rotula: eu não sou borderliner, não sou maníaco-depressiva, não tenho traços de suicida, não tenho síndrome do pânico, não tenho dupla personalidade, não sou bipolar, não sou portadora do transtorno-obsessivo-compulsivo, etc.
Uma amigona fala que eu sou "simplesmente necessária".
Outra fala que eu sou "a agenda mais ocupada do planeta terra". Já fui, já fui...
Um amigo ultra próximo diz que eu sou "um clássico", tal qual uma pianista em um trio de jazz na New Orleans dos anos 30. Adoro ser os "clássicos" que ele inventa...
Muitos me conhecem por "Flammes", e isso era o rótulo sinônimo da boa e velha agitadora de encontros, viagens, baladas, sinônimo da "chama que nunca apaga", sinônimo da solteira e baladeira inveterada que algum dia eu fui.
Alguns ainda me chamam de "Flammes", sem que isso seja atrelado à imagem da solteira e baladeira inveterada - mas aí é menos um rótulo e mais um apelido.
A de Nova York me chama de Flammes: mas ela inventou o apelido e ajudou a formar o rótulo em volta dele. Diz ela: "testemunhei o nascimento de um mito".
Meu amigo que virou juiz fala que eu sou "burning Rome", mas porque pelo rótulo dele eu sou o sorriso que ilumina. Carinhoso isso.
Uma querida do mundo disse que eu sou "o equivalente humano ao Panda Po", rótulo que eu acho gostoso e divertido.
A mulher que sentou do meu lado no avião indo para Buenos Aires me rotulou "vulgar" por ser uma mulher viajando sozinha de mochila.
Um grupo de pessoas me chama de "escorpiana", assim como a outras duas pessoas do mesmo grupo, não só pelo meu signo do zodíaco como também por ser a personalização de alguns rótulos que acompanham esse signo.
Meus primos por parte de pai adoram falar que eu sou uma "perdida" nesse mundo.
E meu pai todos os dias insiste que eu sou "uma causa perdida" quando me vê fumando meu primeiro cigarro do dia às onze da noite.
Meu ortodontista adorava dizer que eu sou "filha de dentista", coisa que realmente sou, mas ele estava se referindo àquela dentição bizarra que eu tinha e que me fez usar 11 anos de aparelho.
Minha prima-amiga-irmã me chama de "prima-amiga-irmã" e eu adoro.
Um amigo que mora longe adora me falar que eu sou "as saudades mais gostosas" que ele já sentiu. Me sinto honrada com isso.

E eu com tudo isso?
Eu sei lá.
Tendo a concordar com o morador de rua, que seres humanos não são embalagens.
Mas no final das contas preciso confessar que me divirto.
E que deep down, não me encontro em nenhum dos rótulos que me deram de presente - mas se isso for uma crise existencial, só vou saber daqui um tempo, porque hoje em dia não é.

ps.: É engraçado ver como pessoas que me conheceram exercendo os mesmos papéis (amigos, amigas, companheiros, familiares) têm impressões tão diferentes de mim - por um lado, pelo jeito que eu me portei com cada um deles; e por outro, pelo jeito, personalidade, história, de cada um. Isso daria um belo tratado junguiano sobre as máscaras que a gente veste ao exercer nossos papéis.

19.8.08

Curtas

de uma semana longa em tempos corridos.

- Uma das melhores loucuras que eu poderia ter feito por mim mesma foi ir para Salvador por um final de semana apenas, para me ver cercada de pessoas especiais e amigos queridos de tanto tempo.

- A amiga de Nova York se-foi-se. Nos despedimos lá, no meio do casório. As duas bêbadas. Choramos muito mais do que o necessário e muito menos do que eu gostaria. Vai ficar um buraco a ausência dela dessa vez, depois de dois meses do mais puro - e delicioso - grude. Tudo bem, sempre tem o ano que vem.

- Casório legal é assim: noivos tão queridos e tão felizes que não cabiam em si. E essa felicidade contagiava cada um dos convidados que lá estavam. Pulávamos, cantávamos, gritávamos, bebíamos, assim - como se não houvesse amanhã. Celebrando o amor em uma festa memorável perto do mar que refletia, sereno, a deslumbrante lua cheia daquela noite.

- Saldo de UVA/UVB: dois dias na praia, debaixo de um sol de julho delicioso e quente.

- Saldo gastronômico: sexta: acarajé, lagosta, polvo, ostra, peixe, camarão; sábado: iscas de peixe na praia e todos os frutos do mar em uma delícia gastronômica sem fim e abundante no casamento; domingo: casquinha de siri, camarão ao molho de maracujá com arroz com passas. Está bom ou quer mais?

- Aquela acupuntura naquela quarta nunca foi tão essencial para a minha sobrevivência quanto semana passada.

- Coisas que só tem na Bahia e que me fazem bem: ser recebida por bahianas e capoeiristas no aeroporto (mesmo que pasteurizados, são deliciosos); taxista reclamando do frio de 22 graus que fazia na cidade; aquéle sútaque delicioso e arrastado, preguiçoso, cantado, que me soa tão bem; algumas frases únicas de se ouvir, como a que eu ouvi do garçom do bar de praia: "ontem, a noite estava tão fechada que o céu estava até vermelho".

- Correr do trabalho para a depilação para casa pintar unha arrumar mala separar tudo tomar banho dormir. Correria que eu não tinha há tanto tempo. Deliciosa correria.

- Ultimamente tenho me esquecido de fumar. Sinto que o próximo passo, natural, será parar.

- Ir trabalhar a pé tem me feito um bem sem noção, delicioso, absurdo. Tenho colecionado histórias de conversas roubadas no meio do caminho. Algum dia eu conto.

- Olimpíadas e essa torcida de todo mundo é muito bom.

- Chegar no trabalho novo e ser assim, tão extremamente bem recebida, é muito melhor do que eu imaginava que poderia ser a priori.

- Aliás, acordar feliz e ir trabalhar feliz tem me sido uma bênção.

- Desde que o CQC começou a passar na TV brasileira minhas noites de segunda feira têm sido consideravelmente mais felizes.

- Trabalhar no epicentro dos acontecimentos legais é muito bom. Ontem quando eu saí do trabalho passei na livraria e vi um debate com o Paulo Markun, Samantha Power (autora do Chasing the Flame) e Carolina Larriera (ex esposa do Sérgio Vieira de Mello). E aí a Samantha autografou meu livro. O Senador Suplicy também estava lá. E eu estava, como sempre, acompanhada em tão perfeita harmonia do meu amigo-vizinho. Hoje quando eu saí do trabalho lá na minha porta vi a inauguração de uma exposição de fotos dos monges budistas de Mianmar.

- Isso posto, as chances de eu me tornar uma pessoa provinciana - mesmo sendo uma paulistana nata - são altas. Quando o lugar que a gente mora é muito perto do trabalho e é muito perto do lazer, a vida fica deliciosamente cômoda - e a chance de eu abrir mão disso é pequena.

- Usar o carro só para meus momentos de lazer é absolutamente fantástico.

- Perder hoje para a Argentina foi bem triste.

- Hoje de manhã ver o Lipovetsky falar em uma palestra com um público fantástico e selecionadíssimo é coisa única de se ver.

- Estar na Bahia quando da partida de Dori Caymmi é triste. Mas é bonito também. Só se falava disso: na recepção do hotel, no ônibus, no táxi, no restaurante.

- Lamentável o incêndio que destruiu o Cultura Artística. A última vez que fui lá foi para assistir a encantadora "Casa dos Budas Ditosos" com a Fernanda Torres. Mas esse teatro deixa um legado triste, para ampliarmos para todos os bens culturais do nosso país: o que a displicência da população e do governo tem feito com eles?

- Acho que faz uns quinze dias que não vou ao cinema. Estou com saudades.

- Triste volto eu da Bahia quando tive um final de semana perfeito mas não consegui encontrar pessoinha baiana tão especial. Tudo bem. Parece que em setembro nos encontraremos, mas dessa vez, aqui.

- Vou ao show da Madonna de qualquer jeito.

- As pessoas que já estão pensando no seu Reveillon 08/09 me dão uma certa aflição. Mas pelo menos agora eu não tenho mais a sensação de "não faço a mínima idéia do que acontecerá na minha vida até lá". Agora eu já tenho idéia.

- Quando quem já me entrevistou (e não me quis) me vê empregada novamente e realmente feliz, e fala que "ainda quero que você trabalhe lá com a gente", fica na boca um gostinho bom do "viu como você fez bem em não me querer? Estou em um lugar muito bacana agora."

- Permaneço não gostando de fofocas e loucuras e pessoas estranhas. E cada vez mais eu descubro que o mundo está um lugar estranho de se viver, quando as pessoas mais próximas aprontam umas coisas tão babacas...

- Já estou sentindo falta de algumas coisas. Mas não se pode ter tudo que se quer ter. E afinal, estou feliz com essa vida que eu quis. Agora, é esperar o tempo quando tudo se ajeitará e entrará de novo nos seus devidos eixos.

10.8.08

Na Bahia-iá-iá...

...tudo é motivo de alegria-iá-iá...

Contagem regressiva iniciada oficialmente sexta feira passada. Contagem regressiva curta, diga-se de passagem. De apenas uma semana. Nessa contagem regressiva, e com tanta coisa ainda por se resolver, sei que nem verei o tempo passar.
(apenas gosto da sensação de celebrar o final da novela da minha compra de passagem aérea, que aquilo foi uma loucura. A amiga de Nova York nem achava mais que eu conseguiria...)

Melhor assim.

Minhas três idas a Bahia até agora sempre representaram fases emblemáticas na minha vida, coisas muito boas, muita novidade. Engraçado isso, na minha história de vida dos últimos 6 anos, a Bahia sempre esteve ligada às mudanças concretizadas e às novidades surgindo.

Dessa vez não é diferente.

Com um adendo importante: estou indo para uma cerimônia de celebração ao amor, porque eu acho tudo isso muito lindo, noivinha de branco, noivinho de terno, familiares chorando, flores por todos os cantos, amigos bêbados e emocionados... (o noivo mesmo disse: "casamento é uma instituição emocionalmente desgastante", no que eu tendo a concordar sem muitas dúvidas)
Sexta feira o noivo me prometeu um casamento-rave: doze horas de festa. Vai ser legal, com certeza.
Mas o melhor de tudo dessa festa na verdade é o noivo, que me é tão querido quanto um abraço apertado e demorado no dia que eu invadi a despedida de solteiro dele sem ser avisada. E depois do noivo, a celebração ao amor.
Mas se junto com tudo isso eu tiver um casamento-rave com 12 horas de festa, daqueles para deixar guardado, para deixar sem voz, para lembrar domingo de ressaca e para lembrar todos os dias da outra semana com ressaca extra, então esse final de semana será muito melhor do que eu esperava a priori.

Ok. Contagem regressiva iniciada.

Quero vê-los, lindos e felizes, o noivo e a noiva. Quero ver, na Bahia de Todos os Santos, a noite de lua cheia do mês de agosto, do bom-gosto. Quero ver, no pôr-do-sol visto na Cidade Baixa, a Bahia de Todos os Santos iluminada por um dourado lindo e muito bahiano que selará mais uma celebração ao amor.

Mas se hoje é domingo... e eu viajo na sexta... faltam exatos cinco dias para que eu chegue à Bahia.

Três curtas e um adendo

Agosto, mês do Bom-Gosto
Pois é. Julho começou hardcore, e permaneceu hardcore.
Primeiro, com a maior fuga covarde e patética já vista. Depois, recheou-se com cirurgia na família e uma revisão gigantesca dos seis primeiros meses desse ano. E muitas, muitas, muitas, crises. Simplesmente às vezes eu achava que não aguentaria (mas sempre que a gente acha que não aguenta, no fundo, sabe que aguenta).
Foi prova de fogo.
Julho terminou naquele almoço da quarta dia 30 e uma notícia que é desabante para qualquer ser humano que a recebe.
Julho terminou naquela hora, 19hrs, da quinta dia 31 e a resposta final e o novo início declarado oficialmente. Depois disso, toda a euforia silenciosa e a sensação de não caber em mim.
No final eu estava muito mais viva do que imaginaria a priori - com uma diferença: não sei precisar quantos exatamente, mas alguns quilos a mais com certeza.
Hoje, uma amiga disse:
"os kilos você perde depois. Já diria o jargão dos economistas: no free lunch, baby".
Hoje, outra amiga disse:
"lembra que você ficava falando para a gente? Esperem agosto... Agora, o SEU agosto chegou".
Em agosto, mês do bom-gosto, muitas das novidades positivas que uma pessoa possa receber e um final de semana na Bahia. Por enquanto acho que não preciso de mais nada - e os kilos a mais irão, certamente, embora.

Dia dos Pais
Todo ano, Dia dos Pais, Dia das Mães, e todas as outras datas, são solenes. Aqui na minha família, escolhe-se restaurantes a dedo, faz-se reservas, tudo o mais. Hoje íamos, de fato, almoçar com a família de um tio, e seus filhos. Mas meu irmão passou mal e não saímos de casa no final das contas. Foi apenas um domingo normal - e foi aí que percebi que é nos domingos normais, de almoço em casa, é que somos mais felizes. Não tivemos a solenidade de um Dia dos Pais normal, não nos encontramos com tios, primos. Ficamos aqui, isoladinhos. Meu pai decidiu pilotar o fogão e ficou feliz da vida com o resultado de seu macarrão. Meu irmão ficou melhor com o colo dos pais. E nós quatro ficamos assim, em casa, e felizes.

Sorte no Jogo, Azar no amor
Se isso é verdade mesmo, então minha sorte no amor deve estar para chegar. Não aguento mais perder as rodadas de War com os amigos e as rodadas de tranca em família.

Um adendo
Adoro minha capacidade de dar o que eu chamo de "presentes cirúrgicos", aqueles inesperados, fora do comum, e que acertam na mosca. Pois é. O presente de Dia dos Pais que dei para ele foi assim mesmo: um sorriso largo abriu-se, e um olhar abismado e brilhante folheava as folhas do livro, praticamente não acreditando. Mais um dos presentes cirúrgicos para minha coleção.

1.8.08

A estranha mania de ter fé na vida, vai ter de ser faca amolada

Eu sempre tive fé na vida, e alguns até me questionavam e achavam estranho.
Um pouco louca, quem sabe.
Sempre gostei de atitudes arriscadas, porque alguma coisa bem irracional lá no fundo das minhas idéias me diziam que vai dar certo - era fé, certamente.
E agora, é isso, vingou, virou, deu certo.
É muita fé, muita força de pensamento, muito acreditar em coisas abstratas e também em coisas muito concretas.
Às vezes me bate a certeza que ser um pouco jedi nas idéias e na cabeça é simplesmente uma questão de sobrevivência.
É isso, se a gente realmente acredita, se a gente realmente coloca atenção, coloca esforço, se dedica, cuida, se volta para isso.
Se a gente vai, e anda com fé.
Pronto.
Dá certo.
Minha sensação interna de felicidade é tão absurda que eu não sei se consigo expressar ela da maneira devida. Na verdade eu não sei se as pessoas gostariam de compartilhar isso, ou até, se elas entenderiam tamanha euforia. "Exagerada ela, não?"
O ponto é que é uma conquista tão grande e tão minha que ninguém além de mim sabe o real tamanho da relevância disso tudo.
E hoje eu definitivamente não caibo em mim. Estou muito maior.
Então eu fico quieta, soltando fogos de artifício por dentro, em um constante surto emocionado calado e eufórico.

Fé Cega, Faca Amolada
(Milton Nascimento / Fernando Brant)
Agora não pergunto mais aonde vai a estrada
Agora não espero mais aquela madrugada
Vai ser, vai ser, vai ter que ser, vai ser faca amolada
O brilho cego de paixão e fé, faca amolada
Deixar a sua luz brilhar e ser muito tranquilo
Deixar o seu amor crescer e ser muito tranquilo
Brilhar, brilhar, acontecer, brilhar, faca amolada
Irmão, irmã, irmã, irmão de fé, faca amolada
Plantar o trigo e refazer o pão de cada dia
Beber o vinho e renascer na luz de todo dia
A fé, a fé, paixão e fé, a fé, faca amolada
O chão, o chão, o sal da terra o chão, faca amolada
Deixar a sua luz brilhar no pão de cada dia
Deixar o seu amor crescer na luz de todo dia
Vai ser, vai ser, vai ter que ser, vai ser muito tranquilo
O brilho cego de paixão e fé, faca amolada

Maria, Maria
(Milton Nascimento / Fernando Brant)
Maria, Maria
É um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece viver e amar
Como outra qualquer do planeta
Maria, Maria
É o som, é a cor, é o suor
É a dose mais forte e lenta
De uma gente que rí quando deve chorar
E não vive, apenas aguenta
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria mistura a dor e a alegria
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca possui a estranha mania de ter fé na vida...
Mas é preciso ter força
É preciso ter raça
É preciso ter gana sempre
Quem traz no corpo a marca
Maria, Maria mistura a dor e a alegria...
Mas é preciso ter manha
É preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca possui a estranha mania de ter fé na vida....

29.7.08

Compartilhando a Cumplicidade do Silêncio

É engraçado isso, mas a partir de algumas situações pelas quais vivi, eu desenvolvi uma teoria bem simples.
Segundo essa teoria, a gente descobre que é realmente íntimo de alguém quando consegue ficar em silêncio na companhia dessa pessoa sem que isso signifique nenhum tipo de incômodo ou angústia para nenhuma das partes.

Minha teoria não é empírica e nem passou por testes para concluirmos alguma coisa sobre a real veracidade e aplicabilidade dela, mas é fato que, entre as pessoas com quem dividi essa idéia, a aceitação da teoria foi unânime (às vezes penso que posso ter questionado somente às pessoas que têm alguma característica próxima da loucura, similar à minha loucura particular).

Na verdade o ponto é que duas pessoas, quando estão juntas, normalmente não ficam quietas. E ficam falando, falando, falando, incessantemente, mesmo que não tenham mais o que falar. Elas simplesmente inventam assuntos, papos, causos, e preenchem o tempo com isso.
Porque nesses casos o silêncio entre essas pessoas traz sempre uma série de dúvidas:
. No que você está pensando agora?
. Você ficou quieto por que por acaso está bravo comigo?
. O que em seus pensamentos é nesse exato instante mais interessante do que dividir idéias comigo?

O ponto principal é que quando a real intimidade existe, o silêncio não incomoda, o silêncio não soa ameaçador (o silêncio ameaçador, inclusive, faz muito mais barulho do que 10 mil decibéis em algum festival de verão europeu). Muito pelo contrário, o silêncio conforta. Ele não tem nada de antipático nem de anti-social. Um interlocutor não está bravo com o outro simplesmente porque optou por vagar em suas idéias e somente nelas.

O silêncio compartilhado é na verdade o ponto alto da cumplicidade.
. Eu não preciso estar sozinho para mergulhar em meus pensamentos.
. Eu aceito a sua companhia nesse meu momento tão interno.
. E eu gosto da idéia que você também esteja imerso em seus pensamentos enquanto eu estou nos meus.

Essa para mim é a mais alta intimidade: quando é possível para duas pessoas que elas conversem e silenciem com a mesma naturalidade e facilidade. Nas vezes em que vivi isso, percebi que isso é atingido após muita convivência, ou após uma identificação fácil e forte e rápida.
Sabe aquela história que podemos contar nossos amigos de verdade com os dedos de uma mão só? Eu talvez discorde dessa idéia, porque sempre que penso nos meus amigos de verdade isso normalmente dá mais. Mas para além das amizades verdadeiras, existe a intimidade verdadeira. E as pessoas com quem eu divido o silêncio em total conforto são pouquíssimas e raras.

Exemplares únicos.

Óbvio que para as pessoas que discordam da minha teoria, todos os parágrafos acima são a mais linda baboseira já testemunhada pelo universo...
Já para as pessoas que concordaram com a minha teoria, a metade de mim que acredita na magia do mundo vai um pouco mais longe.
Ela acredita que os pensamentos dialogam no silêncio, por isso que o silêncio compartilhado significa tamanha intimidade absurda – ele nada mais é do que um diálogo entre pensamentos.