17.12.08

Frases do Admirável

Pois é. Conforme passa o tempo, a gente vai se encontrando em afinidades com outras pessoas que superam as afinidades comuns. Por exemplo, essa coisa de ser fã do Contardo Calligaris. O cara não escreve fácil, porque às vezes as verdades dele são difíceis de serem lidas, embora ele escreva gostoso e fluido - o que teoricamente tenderia a significar que todos o lêem. Não é bem isso o que acontece: pelo menos com quem eu convivo, muitos o acham intragável, pelo que ele expõe que está dentro da gente e que ninguém quer ver.

Nesse contexto, das coisas que estão dentro da gente e que ninguém quer ver, reproduzo aqui alguns trechos da coluna dele do dia 11/dez/2008: "Zoé e 0 demônio do meio-dia".

"Sobre o tal demônio do meio-dia muito foi escrito e dito: diferente dos diabos que se escondem nos cantos escuros, o que será esse malefício que nos espreita justamente quando o sol está no zênite e o mundo nos aparece sem sombras?
Uma leitura moderna diz que o demônio do meio-dia não é um bicho do inferno, mas é um sofrimento insidioso, específico de uma época em que faltam cantos escuros.
Ele é nossa própria tristeza, a depressão e o tédio produzidos por um mundo com poucas sombras e poucos mistérios.
Em outras palavras, as luzes da razão e da ciência acabaram com aquele sentido que só uma transcendência (divina ou diabólica, benéfica ou maléfica, tanto faz) podia conferir à vida.
Por excesso de luz, em suma, o mundo perdeu seus horrores, mas também seu encanto; com isso, é preciso que Deus nos proteja do demônio do meio-dia, ou seja, do tédio e da tristeza.
Ao inventar cantos escuros e ao povoá-los de "troços" inquietantes, Zoé está se protegendo contra o demônio do meio-dia -com toda razão, pois esse é provavelmente o mais pernicioso de todos.
Muito melhor se deparar com Freddy Kruger do que não achar graça no mundo.
"Filosofia do Tédio", de Lars Svenden (Zahar), é uma brilhante meditação sobre a dificuldade moderna em nos interessarmos pela vida, uma vez que ela não é mais justificada pela palavra divina ou por nossa luta heróica contra os "troços" que circulam pelas trevas.
Para Svenden, contra o tédio, ainda não inventamos nada melhor do que o remédio do Romantismo: uma mistura de anestesia (drogas lícitas e ilícitas) com transgressões que deveriam provar que estamos vivendo grandes aventuras e experiências "incríveis".
Se for para escolher, prefiro os esforços de Zoé para repovoar o mundo de monstros e demônios."
(...)
"O tédio moderno é uma forma de arrogância: a vida é chata porque nós seríamos maiores que sua suposta trivialidade insossa; tendemos a menosprezar o cenário onde nos toca viver, como se ele fosse demasiado banal para nossas façanhas. Pois bem, o segredo de Brum* é o oposto disso, é uma extraordinária humildade diante do que existe."
*Eliane Brum, autora de "O Olho da Rua", da Ed. Globo.

As pessoas não se assumem assustadas pelo demônio do meio-dia, muito menos se assumem sofrendo com o mal do tédio e da postura blasè diante de tudo. E aí, às vezes, quando eu fico encantadinha com essas coisas corriqueiras, tipo o chocolate que eu ganhei ontem da amiga do coração (e o que importa é menos o chocolate e muito mais a forma que ele foi dado), estou quase que cara-a-cara com a "extraordinária humildade" a la Eliane Brum. Nada a ver com o tédio moderno, blasè, arrogante, que o Svenden trabalha. Nada a ver com "anestesia e transgressões". Eu diria até, talvez, it's a kind of magic - não tanto pelo que faço ou deixo de fazer, e um pouco mais pelo olhar carinhoso que dou a tudo isso.

Enquanto isso, em algum quarto escuro no centro de São Paulo, alguém grita que não acredita em mágica e que não há mágica. Grita, grita tanto, perde a voz. Fica rouco e sozinho, só quem o escuta é quem está com ele dentro desse mesmo quarto escuro. Esse mesmo alguém, ainda dentro desse quarto escuro, se intoxica, principalmente com as ilícitas, ao mesmo tempo em que tomas atitudes radicais quando sai à noite e consegue extrapolar na balada toda a pressão insuportável desse mundo louco onde a leveza lhe é insustentável. Esse alguém se sente transgredindo e anestesiando, a ele mesmo e aos outros ao seu redor.
Entende tudo isso com alguma forma incrível de curtição, quando não percebe que isso nada mais é do que resultado do excesso de tédio, quando não entende que antes de tudo, seu comportamento é blasè e indiferente - e não intenso, vivido, e vívido.
A esse alguém, tudo o que eu posso fazer é desejar-lhe boa sorte.

Um comentário:

CD disse...

olá! que bom que vc curtiu meu blog! apareça sempre!
eu to mt enrolado nos últimso tempos, mas vou votlar a escrever umas futilidades...rs
eu vi teu blog por conta do blog do geraldo! amigo meu!
bjs
chico!