31.3.08

Not an ordinary Monday

Hoje quando eu acordei algumas coisas estavam fora do lugar.

O céu estava mais azul.
O reflexo do sol, que vem do prédio da frente, estava mais forte.
O olho estava mais difícil de abrir.
O corpo estava mais difícil de mexer.
O sonho estava mais difícil de acabar.
O sorriso estava tão dado, tão fácil, tão bobo-alegre.
O óculos, por incrível que pareça, estava mais vermelho.
O jornal estava mais bacana.
A Umbanda estava mais velha, completando cem anos.
A mosca estava mais barulhenta.
A música estava mais dançante.
O despertador berrava muito mais alto.
Meu francês estava mais fluente.
Um grande amigo continuava na Austrália, mas a Austrália parecia muito mais longe do que já é.
As músicas tristes estavam quase intoleráveis.
Eu estava mais fotogênica.
Eu estava muito mais descabelada.
A torrada do café da manhã estava mais crocante.
E a papaya, por sua vez, mais docinha.
A Cidoca estava ainda mais simpática.
E minha mãe fumava menos logo cedo à mesa.
O vento estava mais fresquinho.
O outono parecia chegar de verdade.
A gente estava mais cheia do que sempre.
A amiga dos loucos scraps às segundas pela manhã estava mais louca do que nunca.
O sol do Nordeste parecia mais perto da minha realidade.
As Cataratas do Iguaçu, um pouco mais longe.
A água desceu mais refrescante.
E a semana resolveu que ela promete, em todos os aspectos da vida que uma pessoa possa ter.

26.3.08

Uma noite e duas músicas no dia seguinte

FLY ME TO THE MOON
Fly me to the moon
And let me play among the stars
Won't you let me see what spring Is like on Jupiter and Mars
In other words, hold my hand
In other words, darling, kiss me
Fill my heart with song
And let me sing forevermore'
Cause you are all I long for
All I worship and adore
In other words, please be true
In other words, I love you
Oh
In other words, please be true
In other words, I love you

SINGING IN THE RAIN
I'm singing in the rain
Just singin' in the rain
What a glorious feeling
I'm happy again
I'm laughing at clouds
So dark up above
The sun's in my heart
And I'm ready for love
Let the stormy clouds chase
Everyone from the place
Come on with the rain
I have a smile on my face
I walk down the lane
With a happy refrain
Just Singin', singin' in the rain
Dancing in the rain
I'm happy again
I'm singin' and dancin' in the rain
I'm dancin' and singin' in the rain

O café se transformou em chopp e tive uma das noites mais legais ever da vida, do tipo de noite que eu não conhecia há muito tempo.
Hoje tô assim, toda babaca.
Tipinho irritante mesmo.

24.3.08

Chocolate, Floral, SMS

Do CHOCOLATE
Nem muito nem pouco. Na casa da madrinha, cobrindo o damasco azedinho. Aqui em casa, um ovo dos pais, pequeno e simbólico, é fato. Um ovo da madrinha, grande e inteirinho recheado de beijinho. Uma loucura. Um ovo da avó. Grandão. Um ovo do padrinho, dos preferidos. E Línguas de Gato do tio. Estoque suficiente pra suprir a carência emocional por meses, provavelmente. Para me ajudar quando não conseguir desanuviar sozinha. Para me ajudar quando a TPM for maior do que eu.

Do FLORAL
A acupunturista disse que seria bom.
Eu não sei se a terapeuta deixa.
A mãe achou estranho.
Eu me encantei com a possibilidade.
Mais uma coisinha para esse meu sincretismo mucho loco.

Do SMS
Antes de dormir, logo depois do MSN.
Intuito fofo de SMS. Eu tornei uma troca de mensagens nonsense.
"Nossos celulares não se entendem". "Não preciso manjar pois você me explica". "Bons sonhos". "Backlog de itens efetivos na agenda". "Café terça?". "Café terça".
Não necessariamente nessa ordem.
Encantamento é gostoso.
Começo é gostoso.

Tomara que role o café terça.

19.3.08

O outono chega

Tudo bem, tudo bem, eu sei que não temos mais estações definidas em São Paulo. Também sei que o inverno não será e já não é mais frio, e o outono não será e também já não é mais friozinho. Sei também que a primavera será uma mera continuação do calor invernal e infernal (inversão térmica, essa praga que nos assola a cada julho seco) e que o verão será a intensificação, embora chuvosa, do calor de todas as outras estações.

Mas a questão para mim vai além.
Eu simplesmente ADORO o inverno.

Moraria fácil em uma cidade de temperatura média anual não acima dos 15, e de preferência na maior parte bem abaixo disso. Não penso em morar no Nordeste porque morreria de infelicidade de abandonar meu guarda roupa de inverno em São Paulo, Nordeste só é bom para férias, quinze dias no máximo e olhe lá, não aguento todo aquele calor não. Eu passo o tempo todo entre março e setembro acompanhando de perto o noticiário metereológico (Josélia Peggiorin, da Climatempo, diretamente para a Rádio Eldorado FM), esperando que anunciem uma garoa, uma frente fria, uma noite com mínima de sete graus. A Lau disse que eu tenho um oratório de nuvenzinha, onde eu fico rezando e implorando que chegue logo a frente fria. Mesmo morando nos trópicos, meu guarda-roupa de inverno é mais vasto do que meu guarda-roupa de verão (e olha que meu aniversário é na primavera). Eu aprendi metereologia sozinha, quase como uma auto-didata, misturando conceitos de física, biologia, geografia, química, simplesmente pelo instinto de sobrevivência de querer entender quando a frente fria chega. Mesmo com um calor de 30 graus lá fora, me fecho no meu quarto, ligo o ventilador, e fico experimentando meus looks de inverno, como que querendo matar saudades das roupas (essa crise tem geralmente seu auge em janeiro).

Fico feliz quando o tempo permite e pede que eu durma de meia.

Pois bem. Tudo isso posto, já é possível imaginar minha vibração de felicidade quando o tempo fechou quinta da semana passada, né? O oratório de nuvenzinha estava quase com um brilho neon de tão feliz. Ele estava funcionando, finalmente...

Me empolguei. Peguei a calça jeans, a blusa de manga três quartos, a capa de chuva comprida, uma bota. Estava vestida de outono, pela primeira vez em 2008. E isso se repetiu algumas outras vezes entre sexta e segunda... me vestir de outono todos os dias, feliz, realizada, testando os visuais. Fazer maior visual outonal produzido simplesmente pelo prazer de me vestir de outono, mesmo que seja só para pegar pão na padoca.

Fazer o que? Eu sou assim... tinha que ter nascido em algum lugar frio...

Foi completamente uma over reaction outonal. Mas que eu adorei, adorei.

16.3.08

O tio da Little Miss Sunshine e o Sartre

OU: PONTUANDO COISAS QUE ME DÃO INSÔNIA EM PLENO SÁBADO

- mudança na prática do complexo e me acostumar com essa novidade.
- email discutindo o menino de oito anos que passou na faculdade, e uma resposta bizarra de uma linha.
- email discutindo coisas meio deprês e depois discutindo coisas meio felizes, mas tudo meio estranho e intalado.
- conversar com o ex fofo de uma grande amiga e ver como é triste certas coisas.
- chegar em casa e entrar no MSN, por estar com insônia.

E embora tudo esteja muito abstrato (é para estar mesmo), cheguei em casa e me olhei no espelho do elevador. O cabelo estava bom, a cara estava boa, a maquiagem estava boa, a roupa estava boa, e mais uma vez o fim da noite tinha um destino absolutamente solitário.

11.3.08

Retificação

Contra todas as previsões, chegou hoje minha Carteira do Cidadão. Peço desculpas à CEF se por um dia inteiro subestimei sua eficiência. Agora me surpreendi, e acho justo que me retrate nesse mesmo fórum onde uma vez a critiquei.
Sem mais.

10.3.08

Destino: Centro - Parte V, Final

OU: DO RETORNO PARA CASA

Feliz com os resultados obtidos durante o dia, seguro-desemprego encaminhado, Cartão-Cidadão protocolado, FGTS depositado, e almoço aproveitado, voltei para casa com aquela inspiração gostosa de quem se sente vitoriosa. Aquela coisa de ar que enche peito que estufa tórax que projeta externo para frente ombros para trás escápulas para baixo encaixa a púbis não força a lombar e anda bem. Nossa, e como anda bem! Firme, em frente, e com fé.

Passei de novo na frente do Centro Cultural Banco do Brasil, e lá estava um duo de violinistas muito bonito, tocando o Fantasma da Ópera que era de emocionar. Do meu lado, mais uns dois ou três gatos pingados. Um deles era uma mulher, segurando a bolsa debaixo do ombro, e que foi assaltada por dois menininhos frenéticos que eu tinha visto duas esquinas atrás cheirando cola. Não tinham mais de oito, dez anos, com certeza absoluta. Foi triste ver, mesmo.

Daí peguei a rua da Quitanda e fui... passei pela Patriarca e sua marquise branca e bizarra, absolutamente fora de qualquer contexto naquele centro bonito. Atravessei o Chá, Anhangabaú lindo lá embaixo, muitas lembranças e muitas saudades da Virada Cultural do ano passado, querendo que chegue logo a desse ano, experiência cultural que deu muito certo nessa SP cheia de uma população necessitada de viver bem e plenamente o espaço público e que raramente consegue.

Cheguei ao shopping Light, irresistível quiosque de sorvetes do Mc lá logo na entrada, um McFlurry por favor, e sentei na escadaria do Municipal, de onde contemplei. Contemplei o sorvete, o calor, o suor, o sol, o barulho, a sujeira, a pobreza, a beleza, a feiúra, e tudo o mais que se pode contemplar sentada na escadaria do Municipal. Contemplei inclusive o cheiro de xixi, que estava forte. McFlurry aroma urina.

Atravessei de novo o Chá, já de volta para casa. De lá pegaria a Libero de novo, e depois a rua do Ouvidor, a passarela, e chegaria no Terminal Bandeira. Escolhi conscientemente o caminho mais longo, apenas pelo prazer de acabar a caminhada.

Quando olhei, do Chá, para onde a 9 de Julho e a 23 começam, vi uma bandeira do Brasil enorme hasteada lá. Bem grande mesmo. Eu nunca tinha visto aquela bandeira. Bonita.

7.3.08

Destino: Centro - Parte IV

OU: DO ALMOÇO

Pois bem que naquela loucura daquele labirinto burocrático e sobe escada e desce escada e entra em fila e sai de fila ligou o telefone tocando e era ele com quem eu tinha combinado um almoço. Saio correndo da CEF, praticamente deixando o inferno terreno e tão quente para trás e indo almoçar com o amigo que hoje é uma das pessoas mais fortes e importantes na minha vida. Não fomos almoçar em um lugar com ar condicionado e fresquinho, mas simplesmente sua companhia me traz a brisa leve e gostosa que eu precisava sentir na vida naquele dia.

Antes disso, fui a pé até a SanFran, já que eu sabia que ele estaria lá por perto, e fiquei observando o movimento de advogados engravatados naquela região, tão louca essa força essa tradição e toda a história da mais antiga faculdade de direito de São Paulo. Não sei dizer bem o que é esse ímã, desde aquele agosto de 2000 quando fui apresentada à SanFran nunca entendi ao certo o que é isso que ela exerce sobre seus alunos. Grandes amigos, um primo, duas primas distantes, e toda uma constelação de conhecidos e queridos já estudaram na SanFran. Todos eles mantém até hoje essa ligação muito forte que não dá para entender. Já sei que a faculdade onde estudamos tem muita importância na nossa história de vida, eu mesma sou uma prova viva disso, mas a SanFran tem alguma coisa inexplicável e muito forte e muito louca.

Divagações à parte, fiquei lá esperando o amigo ligar e ele ligou e eu fui lá para a rua Riachuelo. Subi e conheci o escritório dos queridos do peito... tão bonitinho o escritório, tão ajeitadinho, com tanta carinha de coisa legal. Saí de lá extremamente bem impressionada. Eu acompanho as histórias do escritório de perto, todas todinhas, mas ver o que é o escritório de verdade, ver o amigo ser chefe de verdade, cumprimentar os porteiros, brincar com o ascensorista... e pronto, conheci de verdade o escritório. E bato palmas. E tiro o chapéu. E sei que, com aquelas pessoas lá, com aquela lousinha lá, vai longe...

Almoçamos em um restaurante que é o mais pé-limpo dentre os pés-sujos do centro. Parece que ele quis ir devagar, doses homeopáticas de centrisse aguda em mim, e a comidinha estava boa e para manter a tradição a conversa estava boa também. E de fato, o restaurante era limpinho. A comida, normal - nem boa nem ruim. Poderia ser pior... Daí fomos tomar cafézinho, e ele queria me mostrar que o centro também pode ser high-level. Ok, ok, tomemos cafezinho cheio de frescuras, menino, tomemos... e no papo do almoço e do cafézinho, histórias do centro, das bagunças, dos restaurantes chiques e caros, dos restaurantes muito sujos com garçons que ficam gritando um pro outro, e assim em diante.

Ele se sentia meu anfitrião, a pessoa responsável por me mostrar que o centro é legal, mesmo que eu já soubesse disso. Ele estava me mostrando o centro DELE, e era isso o mais relevante daquele almoço. Muito louco isso de eu aparecer lá no território dele, mas que é todos, só que é mais dele do que meu, e aí ele toma para si a responsabilidade de me mostrar o espaço. Meio pavão, macho orgulhoso, enche o papo e conta histórias com orgulho. Com a diferença que não estávamos falando de uma cerimônia do acasalamento, estávamos falando apenas de um almoço entre amigos (amigos que se vêm duas vezes por semana, normalmente).

O homem em geral tem uns mecanismos, para dizer o mínimo, curiosos...

Quase duas horas depois, eu tinha que voltar para a Caixa e ele tinha que voltar para o escritório. No café, ele queria me mostrar o caminho de como eu chegaria de novo na CEF, e qual não foi a surpresa dele quando ele descobriu que eu, a patricinha perdida no centro, sabia exatamente onde estávamos e sabia melhor ainda o caminho da volta.

Um forte abraço, e a certeza de que na próxima vez nosso almoço será no Flor da Sé - o pé-sujo dos pés-sujos da Praça da Sé.

3.3.08

Elvy x Aura: Na trincheira da fronteira do conflito iminente

As duas são bem formadas em boas universidades e trabalham em uma grande e boa empresa, onde eu costumava trabalhar até ano passado.

Elas eram nosso suporte para assuntos operacionais locais de cada um dos países, assuntos nos quais à distância não poderíamos tocar, mesmo sendo "Latin America Service Center" para esse tópico com o qual trabalhávamos. Por exemplo? Pagamentos nas folhas, remessa de montantes, pedidos de visto, essas coisas...

A Elvy, da Venezuela, a boa performance em pessoa. Uma graça de simpática, pela foto ela era até bonitinha, adorava falar com a gente no telefone.

A Aura, da Colômbia, personalidade polêmica (para dizer o mínimo). Fofinha à priori, mas quase não respondia emails, nem atendia telefonemas, e dava canos atrás de canos e fugia que era uma beleza. O curso de sabonete que ela tinha feito era bem sucedido.

Pois bem. Muitos transitavam entre Venezuela e Colômbia a trabalho e o caminho inverso tambem é verdadeiro. Ou seja, necessitávamos à exaustão que as duas trabalhassem bem juntas. Mas sempre, sempre, sempre que precisássemos de alguma coisa que as duas fizessem, só mesmo fazendo call com as duas ao mesmo tempo, e mesmo assim ninguém garantiria que o serviço sairia.

Aura não gostava de Elvy, Elvy não gostava de Aura, e era declarado. Mesmo assim, Elvy costumava dar um belo dum banho de superioridade porque ela faria as funções necessárias. A Aura não, tática de guerrilha, aprendizado com as FARCs, fugia fugia e não fazia o necessário.

Politicamente, Elvy era da elite venezuelana, do tipo que saiu às ruas quando Chávez perdeu o plebiscito do ano passado de reeleições eternas. Aura era contra Uribe, "el embajador de las voluntads de los EEUU que eran muy prejudiciales a mi patria linda".

Agora, o país de Aura invadiu ilegalmente as fronteiras com o Equador, matou pessoas dentro do Equador, e cometeu um ato de guerra. E o Chávez, ao qual a Elvy é contra, mandou suas tropas lá para o meio do mato, onde a Colômbia e a Venezuela se encontram, no meio da Amazônia. Todos entrincheirados na fronteira. Estudantes e ex-estudantes de RI todos com formigas na barriga, de pensar em Clausewitz em uma guerra oficial entre Estados, não só guerras civis, mas sim daquelas guerras que a gente só vê na Europa e aqui nessa latinidade bagunçada, só vimos no Paraguay e mesmo assim já faz tempo.

De qualquer forma, eu particularmente duvido que vire guerra. Acho que, para variar um pouco em se tratando de Chávez, são bravatas e ameaças em alto e bom tom. E só.

Do meu lado só fico triste porque aposto que se Aura e Elvy já não trabalhavam juntas antes... que dirá agora!

Destino: Centro - Parte III

OU: DA BUROCRACIA BURRA DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

De verdade que eu tinha saído feliz do Poupa Tempo e da rapidez com a qual fui atendida. Daí me perdi um pouco pelos meados das ruas pequeninas que cercam a Sé, quase foi atropelada por um motoqueiro louco, e achei o prédio central da Caixa após pedir ajuda prum guardinha antipático e péssimo da Guarda Civil Municipal.

Muito bonito o prédio da CEF lá na Sé. Histórico, abriga lá dentro um centro cultural. Escadarias antigas, janelas antigas, aquele mármore que não acaba mais... uma coisa linda de deixar qualquer mortal em busca do Bolsa Família abismado.

Pois bem. Mas eu estava em busca do meu FGTS. E como foi demorado consegui-lo... Primeiro me indicaram o andar errado, o primeiro andar. Segundo, cheguei no andar certo, o terceiro, e fiquei na fila porque na teoria dos carinhas da porta do andar eu precisaria necessariamente ter o protocolo do meu Cartão Cidadão para prosseguir com o saque. Fiquei na fila, pedi o tal do cartão, chega em 30 dias na sua casa, ok entrei no banco. Não tinha muita fila para os caixas, então logo fui atendida. A moça foi bem gentil e eficiente (uma rara Nilma na CEF), me garantiu de pés juntos que não, eu não preciso do protocolo do Cartão Cidadão para sacar meu FGTS.

MAS tinha um probleminha (porque óbvio que além de perder 40 mins na fila do desnecessário Cartão Cidadão, algo a mais também precisaria dar errado). O nome da minha mãe estava registrado no meu PIS com um "NA" a mais. Lá ela era Mariana Cristina, e não Maria Cristina. "Não posso pagar seu FGTS como essa informação errada". Coloco a máscara "loser do labirinto da burocracia" na cara e desço pro primeiro andar, no balcão de informações, onde poderei corrigir esse dado. Tive também que pedir o cancelamento do meu Cartão Cidadão, porque nele o nome da minha também estava errado, já que tinha tomado como base a informação do registro do PIS.

Desço bufando as escadarias, com um mau-humor que nem cabia dentro de mim de tão intenso. Me fez abrir um sorriso o telefonema do amigo querido vizinho e irmão de fé e sei lá mais o que falando que ele estava me esperando pro almoço.

1o andar, balcão de informações, burocracia pública daquela maior má vontade do mundo inteiro. Mais 27 minutos na fila, cronometrados e justinhos (só tinha duas pessoas na minha frente, essa informação é bastante relevante para enfatizar o pé no saco). Tiro o "NA" a mais do nome da minha mãe e saio em disparada pro almoço, porque já era tarde, eu estava faminta, e almoçar seria um belíssimo dum prêmio merecido àquela altura do campeonato.

Almoço e volto, ânimos refeitos, nome da mãe sem o "NA" a mais, e decisão de que seria sim uma boa refazer o Cartão do Cidadão porque com ele eu só precisaria ir a uma lotérica qualquer para sacar o Seguro-Desemprego.

O cara do Cartão-Cidadão riu da minha cara ao me ver entrar na fia de novo. Na minha frente na fila, uma senhora bem velhinha e com cara de mãe de família chora ao ver o cara rasgar o cartão do Bolsa Família dela. Aparentemente ela tinha demorado um tempão para conseguir um daquele, mas daí o endereço residencial dela mudou e ele achou justo que ela esperasse mais seis meses pelo cartão dela do Bolsa Família.

Pois bem, refiz o Cartão Cidadão, mesmo sabendo que esse protocolo era desnecessário para o saque do FGTS. Entro na fila do caixa, e lá se vão outros 53 minutos... (sim, porque afinal quem está lá naquela fila é porque não tem mais nada para fazer da vida a não ser tirar o dia para brincar de labirinto da burocracia da CEF). Saco o tal do FGTS, pago os 14 reais (assalto!) de doc pra minha conta, e saio de lá correndo.

Correndo, correndo, correndo, como o diabo foge da cruz, torcendo para nunca mais voltar - a não ser que tenha alguma exposição legal lá no Centro Cultural.

Dialética Kafkaniana

OU: DA BARATA DA VIZINHA

(para o leitor fiel: a série "Destino: Centro", voltará em breve, com três novos e inéditos e ainda inexistentes e totalmente emocionantes posts: "Da burocracia burra da Caixa Econômica Federal", "Do almoço" e "Do retorno para casa". Você não perde por esperar!)

E aí eu li Kafka no primeiro ano de PUC. Já tinha lido no 1o colegial, mas o Kafka basicão: "A Metamorfose". No primeiro ano de PUC, um Kafka mais crítico, mais denso, e mais desesperador: "O Castelo". Para aprender política, Rousseau e Hobbes na veia para assustar bichos de primeira viagem. Depois, só voltei a ler Kafka ano passado, "Carta ao Pai", que ficou tanto tempo intalado na minha cabeceira. E agora está intalado na cabeça. E na garganta, aquela intalação desesperadora de um berro anti-oposto-do-Édipo. Pretendo ler mais Kafkas, mas por enquanto, nessa vida kafkaniana, quero antes dar cabo desse berro anti-oposto-do-Édipo. Então deve demorar mais alguns anos de terapia, talvez, para que eu consiga ler outro Kafka.

Antônio, você está aí?
Antônio, você tem me visitado aqui?
Antônio, você me entende?

Mas voltemos. Domingão, aquela insônia básica pré-começo-de-semana, e eu aqui no MSN. Daí eu disse que eu estava elétrica, e ele perguntou se eu estava apaixonada (por quem eu estaria, meudeusdocéu? Por quem??) no que eu respondi que apaixonada, só por mim mesma. (Porque mulher inteligente é assim mesmo: orgulhosa) Daí ele me achou desanimada e eu disse: desânimo? Eu que o diga... e daí ele quis saber que que eu queria dizer com esse eu que o diga. E eu disse que eu só tinha dito eu que o diga porque antes de tudo ele tinha perguntado se eu estava com insônia por que estava apaixonada e eu disse que apaixonada só se for por mim mesma e ele citou desânimo e eu disse: eu que o diga.

E disse a ele que então tínhamos instaurado a dialética kafkaniana. Disse a ele sobre O Castelo, qual é a história do livro, e qual foi o contexto de vida no qual li esse livro. Contexto esse que vocês podem conferir acima. Expliquei a ele (nas entrelinhas, obviamente como toda mulher e ainda por cima boa escorpiana que sou que se preze) qual seria a relação do Kafka com aquela conversa. Ele lembrou do Kafka, da barata e, pelo msn, e assumindo que fazia piada barata (isso eu tiro o chapéu: esse cara tem um bom senso de humor) começou a cantar a música da barata. Daí eu arrematei, perguntando como fomos parar lá, na paixão, no desânimo, na barata, no Kafka, e no castelo. Nisso ele respondeu que era porque nossos pais tinham nos educado de boa forma e nos oferecido boa educação. Eu bati palmas clap clap clap, porque achei uma saída inteligente. Imediatamente foi escolhido outro assunto para abordarmos virtualmente.

De qualquer forma, conclusão nenhuma foi atingida, e ele permanece sem entender que que eu quero dizer por: eu que o diga. Resumindo a ópera e deixando as entrelinhas de lado, a verdade é que tudo que é devagar por excesso e por princípios pode ser potencialmente e deveras desanimador (fato acentuado pelo fato de eu ser escorpiana, absolutamente passional, verdadeiramente intensa). Eu que o diga, porque ele nunca dirá. Mas de qualquer forma jamais poderia estar apaixonada, a não ser que por mim mesma.

A boa notícia é que tive um diálogo deveras interessante e realmente intrigante nesse domingo à noite. O conhecimento dele por literatura não me decepcionou, muito menos o gosto (dele, meu) bastante atípico por piadas de gosto duvidoso.

Detalhe importante: o Antônio com quem eu dialogo nesse blog não é o mesmo ser humano com o qual eu dialogava no msn o diálogo doravante aqui retratado. (Apenas porque essa observação é bastante importante para o entendimento do post... e aliás, para bom entendedor meias palavras bastam, e o Antônio e o ser humano do diálogo teriam entendido)

Esse diálogo bastante interessante também me trouxe um bom tema para um bom post, então na verdade eu tenho mais é que agradecer pela companhia.

E no começo (da semana), (eu) era o pó. Boa noite de insônia de domingo a vocês!

1.3.08

Destino: Centro - Parte II

OU: DA BUROCRACIA INTELIGENTE DO POUPA-TEMPO

Mesmo caminho do dia anterior, com uma batida de perna um pouco maior, e logo cedo. (Por cedo, considere 10 e meia da manhã, que essa vida de horários flexíveis está me proporcionando algumas boas mamatas)

Minha grande sorte é que não estava muito quente nem muito abafado, e não fazia sol. Estava nublado, mas também não chovia. Simplesmente o tempo ideal para longas batidas de perna pelo centro.

Depois de passar pelo Páteo do Colégio, segui até a bagunça da Sé. Bagunça deliciosa e barulhenta, aquela coisa miscelânea absurdamente. Pastores engravatados pregando ao lado de mendigos bêbados e da Guarda Civil Metropolitana. Tudo isso em uma praça muito grande e muito bonita e verdadeiramente cheia de gente, embora muito suja e depredada também. Andei bastantão por lá, já que o Poupa Tempo está no final da praça.

Muita fila no Poupa-Tempo, mas os caras por lá são bons. Eles sabem fazer a coisa certa. Fui dar entrada no meu de seguro-desemprego. Primeiro uma fila pequena e rápida onde eles verificam se a documentação está ok e pronta. Daí ganhei uma senha e fiquei esperando que meu número apitasse vermelho no painel. Não esperei nem muito nem pouco, apenas o suficiente para ficar lá observando.

Mas no Poupa-Tempo ninguém puxou papo, então foi muito mais uma observação distanciada. Muita gente pedindo Seguro-Desemprego, mas mais gente ainda na fila para se cadastrar para os programas de emprego do governo do Estado. Não sei se esse programa funciona, mas tem muita gente que acredita nele. Eu torço para que dê certo para todo mundo. Aparentemente dá, porque embora tivesse muita gente se cadastrando pro Seguro-Desemprego, as taxas de emprego estão subindo, então acho que algum dia todo mundo que estava lá vai achar uma vaga para chamar de sua.

Depois do meu lado se sentou um mocinho com roupa de descolado. Realmente um outsider que nem eu, mas ele fazia questão de se mostrar outsider. Fiquei torcendo para que o celular dele tocasse e eu pudesse ter uma noção do background do marotinho. Qual não foi minha sorte quando o celular dele tocou... não só uma, como duas vezes! Na primeira vez era o pai ligando, e os dois discutiram pelo celular e em pleno Poupa-Tempo onde as pessoas vão pedir empregos que paguem 200, 600, talvez estourando mil reais, o que eles iam fazer com sete mil. Discutiram as possibilidades de comprar Vale, Petro, ou alguma menor que envolvesse mais riscos e mais ganhos. Queriam com esse dinheiro diversificar os investimentos deles na Bolsa. Sim, eles estavam discutindo sete mil reais para comprar ações. Sim, as pessoas ao nosso lado queriam um trabalho que pagasse 6oo no mês, pessoas bem similares à Dona Vânia ou ao Seu Pedro do dia anterior. Daí ele disse ao pai que depois do Poupa-Tempo teria que ir à FAAP se matricular na DP de História da Economia. Eu particularmente não sei o que eu odeio mais: se são os estereótipos, ou se são as confirmações dos estereótipos. Daí a avó ligou: pediu ao menino que fosse com o motorista dela retirar os vinhos que ela tinha encomendado para o jantar daquela noite. Aiai, e ele lá no Poupa-Tempo. Antes que você, ó caro leitor, me pergunte o que esse menino estava fazendo lá, eu te respondo: ele estava pedindo a Carteira de Trabalho dele, ia começar a trabalhar em uma corretora de ações e precisaria ser registrado.

Daí apitou vermelho meu número no painel. Mesa 21. Era a Nilma minha atendente, mulher bonita, com aquelas rugas que denotam uma bela história de lutas por trás do que eu não via. Não bati papo com ela, ela pedia a documentação e eu dava. Mas fui cordial com ela, e ela cordial, rápida, e eficiente comigo. Me tratou bem, me deu o protocolo carimbado, 30 dias e estará disponível. Disse um muito obrigado bastante sonoro e bem pronunciado, para não deixar dúvidas que eu realmente estava agradecendo a ela. Disse também um tenha um bom dia bastante sonoro e bem pronunciado, porque era realmente isso o que eu desejava a ela, ela que me tratou tão bem. Poxa, ela me respondeu com um sorriso (banguela, mas com batom vermelho). Mais do que meu Seguro-Desemprego em 30 dias, recebi um sorriso da Nilma. Não poderia sair de lá mais feliz do que isso, de um tanto que até fiquei emocionada.

Eu saio feliz todas as vezes que me dirijo ao Poupa-Tempo e que vejo como a burocracia pode ser bem gerenciada e funcionar belamente. É mais ou menos como telefone celular: a gente vivia bem sem ele, mas hoje não sabe mais o que é não ter celular. Poupa-Tempo é exatamente isso: não consigo imaginar o que é tirar uma 2a via do RG, renovar a Carta, ou dar entrada no Seguro-Desemprego em outros estados brasileiros. Mas uma certeza eu tenho: deve ser bem mais difícil, demorado, e sofrido.

De lá, saí com dois desejos secretos:
- que o menino da FAAP tivesse que tirar a CTPS dele no Acre, para suar na pele a burocracia que não funciona.
- que a Nilma realmente, verdadeiramente, tivesse um bom dia.