28.5.08

Blueberry

Vou contar para vocês a história do Blueberry, o carro mais fantástico, amigo e companheiro que poderia existir nesse mundo.
Blueberry, vindo ao mundo em março de 2002, caído nas minhas mãos de recém-motorista no mesmo março de 2002, batizado pela Lau poucos dias depois de ele estar em minhas mãos. Azul marinho ele é, redondinho, pequenino, e completo do jeito que eu gosto: direção hidráulica, rodas de liga-leve, ar-condicionado, travas elétricas, vidros da frente elétricos, quatro portas.
Não tem CD, porque eu gosto da idéia de deixá-lo na rua sem medo de que ele terá um vidro quebrado. Mas tem rádio, porque eu gosto de dirigir ouvindo música e cantando alucinadamente.
Tem alguns apetrechos e patuás. Tem um Ursinho Pooh que eu ganhei da Stephanie e gosto de deixar o Pooh lá porque assim eu sempre me lembro dela e de sua mãe, que me são tão queridas. Tem o Berry: um tigre daqueles de pelúcia pequeninos recheados de arroz, que fica pendurado no meu retrovisor e me acompanha com seu olhar. E tem o Blue, ursinho de pelúcia bem pequenino mesmo que tem aquelas coisas de plástico (cujo nome me esqueci) que grudam no vidro conforme a pressão que fazemos. Pendurados na parte de trás do retrovisor, os patuás: um olho grego de vidro bem bonito; um filtro dos sonhos, que está lá desde que eu ganhei o carro, porque eu queria porque queria um filtro de sonhos para proteger meu carro; e um terço, porque em todos os carros da família há um terço bento.
Blueberry já foi inúmeras vezes ao Morumbi ver o Tricolor jogar com um monte de gente dentro, e voltou ouvindo o Terceiro Tempo da Joven Pan. Blueberry já foi radical e já foi tranquilão, hora fechando e cruzando e fazendo todos os tipos de manobras absurdas, ora seguindo em frente serenamente sem medo de se entregar ao congestionamento paulistano. Blueberry, no começo de sua existência, morreu inúmeras vezes nas desafiadoras ladeiras de Perdizes.
É estranho e raro que eu seja passageira do Blueberry, e ninguém o dirige tão bem quanto eu.
Eu piso e ele responde, e então, com nosso ótimo trabalho em dupla, consigo fazer com que um carro um-ponto-zero pareça quase um um-ponto-oito. Temos uma interação sem precedentes na história dos automóveis e seus proprietários.
Blueberry já viu grupos de meninas atacadas antes da balada e depois da balada, já ouviu música alta com um bando de loucas cantando alucinadamente dentro dele, já viu o Edu parar na sarjeta, abrir a porta do carro, e passar muito mal mesmo logo ali no meio da rua. Blueberry é o carro oficial das voltinhas no quarteirão, de quando o trajeto entre a PUC e os Jardins não era o suficiente para todas as conversas que eu tinha com a Lau, e aí a gente começava a dar voltas no quarteirão sem destino nenhum, simplesmente para acabar o assunto.
Blueberry e eu adoramos pegar uma estrada, principalmente se ela estiver livre. Blueberry não tem medo de estrada de terra.
Blueberry já me viu brigar, rir, reconciliar, chorar, beijar, sofrer, falar no celular, fumar, cantar, conversar.
Blueberry testemunhou muitas coisas sozinho, mas a principal delas foi minha loucura de aniversário quando fiz 25 anos. Só eu e o Blueberry, às 4 da manhã, na 9 de Julho indo pro Cambridge. Só a gente sabia que naquele exato instante eu estava sozinha cometendo uma loucura e tanto.
Blueberry, tadinho, já se perdeu sozinho comigo na periferia de Embu, lugarzinho perigoso de verdade. E além das favelas do Embu, Blueberry já caiu comigo nas bocadas dos arredores da Estrada do M'Boi-Mirim, outro cantinho perigoso de São Paulo - mas nessa ocasião tinha mais gente no carro, muito embora todos tão embriagados quanto eu, após lendário churrasco do Strauss.
Logo no começo de sua existência, bati a roda numa guia quando fui desviar de um caminhão que me fechou, e o pneu fez PLUFT, um barulhão, e a próxima coisa que eu vi, um quarto do meu carro estava totalmente no chão, com o pneu estourado. Peguei o celular: "Paaaaaaaaaai, estourei meu pneu, vem me ajudar", aos prantos.
Blueberry pegou inúmeras vezes a Princess, para irmos para qualquer outro lugar, mas principalmente para irmos pro Image durante muitas sextas feiras seguidas em 2003 e 2004.
Só o Blueberry e a Princess, aliás, testemunharam um beijo bizarro e proibido e escondido e secreto de dezembro de 2007.
De manhã à caminho da IBM muitas vezes Blueberry brincava com seu amigo, Le Poison Blanche, que chegavam juntos ao trabalho - quero dizer à rua 7 do estacionamento da IBM, sob os cuidados atentos do Seu Antônio.
Blueberry já viu muitos amanheceres, muitos voltando da balada, e muitos quando eu ia correr no Ibirapuera bem cedinho e era tão cedinho que eu via o amanhecer do carro.
Blueberry já deu muita carona para muita gente, adoro isso de passar e pegar pessoas em um lugar e levá-las para outro lugar. É muito bom. É quase uma sensação de "pode deixar, eu consigo te tirar desse mundo" (mesmo que temporariamente).
Outro dia, no começo desse ano, Blueberry se encontrou com um caminhão de lixo e se estrupiou. Foi bem feio. Lá na delegacia, fazendo o B.O. que eu precisava fazer para acionar o seguro, o senhor PM me disse: "Dona Madame, a senhora está me contando que, ao sair da garagem da sua casa, bateu em um caminhão de lixo que estava passando no meio da rua e que a batida foi tão forte que o carro teve que ser guinchado até a oficina?" Rindo por dentro da situação patética e chorando por dentro da situação deprê, abaixei a cabeça e respondi: "Sim, senhor PM".
Blueberry é quem me entende em meu silêncio.
É meu cúmplice sem questionamentos.
Ontem eu deixei o Lindonildo na casa dele e foi passear de carro, curtir a noite paulistana e o barulhinho do motor do Blueberry, fumando um cigarrinho e pensando na vida. Eu estava muito feliz, e quis dividir com o Blueberry, quis que essa sensação de felicidade absoluta durasse mais um pouquinho, quis ouvir boa música dentro de um carro companheiro e acreditar que é verdade que eu sou feliz hoje, e que não adianta relutar contra isso. E que na verdade ficar pensando demais é uma forma de relutar, e que o que me basta hoje é sentir por todos os poros o frescor de coisas novas que 2008 traz para mim. Simplesmente sentir.

Destino: Tríplice Fronteira

- Puerto Iguazu parece uma cidade de faroeste com suas casinhas de madeira, suas ruas desertas, seu sol que racha. Faltou só a bola de poeira e feno rolando, que nem a gente vê nos desenhos animados.

- Essa coisa de Tríplice Fronteira é muito louca. De um lado do rio, um país; do outro lado, outro país; do outro lado, outro país. Praticamente na dimensão da terceira margem do rio que Guimarães Rosa tanto fez ficar famosa.

- Um Duty Free do tamanho de um shopping é algo deveras bizarro e muito, muito, muito louco. Assustador até. Templo do consumo elevado à décima quinta potência. Coisa estranha. Pessoas comprando frenéticamente, todas as variedades de tudo que se imagine: de relógios à vodkas, passando por perfumes e cashmeres. Impressiona e dá medo.

- O hotel era legal, mas não exatamente um master resort. Quase uma coisa tipo "décadence avec élegance". Deu para notar que na década de 60, 70, aquilo lá era um luxo sem precedentes. Hoje ficam os vestígios do passado, que não atualizam pro presente toda a imponência que existiu uma vez. De qualquer forma, a piscina do hotel era uma delícia; a varandinha do nosso quarto, com vista para a piscina, onde fumávamos e tínhamos papos cabeça, foi eleita por mim o melhor lugar do hotel; e as medialunas eram de um deleite sem precedentes. Me empanturrei.

- O céu noturno de Foz do Iguaçu não existe em nenhum outro lugar. Ainda mais quando estamos falando de noites de lua cheia.

- Ciudad del Este é o buraco do mundo. Lugar feio, fedido, barulhento, cheio de gente. Hordas de pessoas comprando sem limites com sacolas gigantescas, prontas para trazer muambas para o Brazil. Uma 25 de março muito, muito, muito, muito piorada. Policiais vagam com escopetas sem policiar nada, e sua não-ação faz com que aquilo lá se torne uma terra de ninguém onde tudo é permitido. Todos os tráficos de todas as coisas acontecem ao mesmo tempo agora. À luz do dia, a céu aberto. É impressionante. Nas calçadas, camelôs e suas tendinhas cobrem tudo e fazem sombra, formando corredores estreitos. Nas ruas, não há organização, não há paz, não há nada. Não há rua, na verdade. Nas portas das lojas, seguranças particulares ostentando escopetas ainda maiores do que as dos policiais. Em tudo quanto é canto, produtos de todos os tipos. Impressionante.

- Atravessei a Ponte da Amizade em um Mototáxi e me senti muito clandestina atravessando a fronteira de mototáxi. Maior legal. Experiência única.

- Itaipu é impressionante. As Cataratas são impressionantes. Região de megalomanias essa região da Tríplice Fronteira. Tudo é muito. As sensações são sempre extremamente acentuadas.

- A oportunidade de conhecer o diretor do Ibama para o Parque das Cataratas foi única. A casa do cara é animal, cravada em uma clareira na Mata Atlântica, cercada de mato, de animais, de rios. Uma delícia. Ele, a esposa, e a filha nos receberam como reis. O churrasco estava delicioso. As conversas, nem se fala. Tudo muito bom. Histórias de onças pintadas, jibóias e corais e cascavéis e quatis.

- Comer costela de chão, que eu nunca tinha comido, na sede da Associação dos Motoristas de Itaipu, que eu nem imaginava que existia, no aniversário de 50 anos do presidente da Associação, que eu não conhecia, foi demais.

- Conheci uma Foz que a maioria dos turistas não conhece, não fui ao Cassino na Argentina e não gastei milhares de dólares no Duty Free. Mas fiz a viagem que eu queria, do jeito que eu queria, conhecendo tudo e tendo experiência sempre muito agregadoras. É isso que faz dela uma ótima viagem: as experiências agregadoras.

- Comi muita carne e meu estômago se ressente até agora, três dias consecutivos de churrasco não é fácil para ninguém.

- Voltamos de ônibus argentino, leito, pagando quase a mesma coisa que pagamos pelo convencional brasileiro, com um conforto absurdamente maior.

- Amei.

14.5.08

Do Filme

- A atuação do Emile Hirsch está indescritivelmente fantástica e impecável.
- A trilha sonora está soberana.
- A fotografia é estupenda.
- A história é intensa em cada átomo de oxigênio, em cada gota d'água.
- As duas horas e vinte passam na sensação de 15 minutos.
- As reflexões são tantas que ainda não sei o que colocar aqui.
- Hoje na terapia falei desse filme, quase que tentando começar a digerir todas as idéias.
- Utopia é acreditar na existência de uma obstinação moderada?
- Já baixei a trilha sonora.
- Quero assistir de novo.

13.5.08

Filme no Cinema

Hoje vou ao cinema, assistir Into the Wild que há muito eu venho postergando de assistir.
As reações de quem viu esse filme são as mais variadas.
Um amigo querido saiu do cinema em tamanho choque que ele mal conseguiu falar no telefone para marcar um café.
Uma amiga gostou tanto que foi duas vezes.
Outra amiga saiu do cinema em êxtase.
E um bom amigo que vi na festa de sábado disse que a moral desse filme é que não nos apaixonamos por uma pessoa, e sim por cada pequena coisa que nos cerca no dia a dia.
Direção de Sean Penn e música de Eddie Vedder e paisagens deslumbrantes o filme inteiro. Sim, deve ser dos mais intensos filmes. Porque a história do cara por si só já é forte a valer.
Amanhã eu conto.

12.5.08

Pensamentos e Sentimentos: variados

- 3a no jantar a lula naquele spaghetti estava um absurdo de bom. Pena, muita pena, que não tomei caipirinha devido às minhas tonturas. Mas não há de ser nada: o restaurante estará sempre lá para quando as tonturas passarem.
. Deleite.
. Vontade.

-3a no Suplicy o Capuccino desceu queimando, doendo, engasgado. No good. Capuccinos não combinam com entrevistas desafiadoras. Perdi o deleite do Capuccino, mas espero de verdade não ter perdido o provável emprego. O diálogo foi bom, ágil, inteligente. Inteligível. Gente que faz, que fala, que me desafia. Aprender a humildade. Ver no outro uma provável não-humildade. Ver no outro uma bela máscara de entrevistador. A China e a Geopolítica, hoje e em 10 anos. Os celulares no Brasil. O Nobel do Yunus - da Paz. O Nobel do Al Gore - da Paz. O Nobel do IPCC - da Paz.
. Suor no rosto.
. Suor em tudo.
. Ondas de calor.
. Taquicardia.
. Angústia.

- 2a e a conversa com a acupunturista. Essa violência interna, louca para sair. Todo mundo ao meu redor sofrendo com isso. E eu, por dentro. Uma agulha aqui, outra ali. Conversa incômoda. Comprei cigarros para fumar na semana, quando tensa não abro mão da nicotina. Nossa, e a tontura desnorteante no final da tarde? Cai na lotérica. Não consegui girar a chave para entrar em casa. Atravessei a 9 de Julho de mãos dadas com uma estranha, de medo de cair. Reconheci meu medo. Fiquei frente a frente com ele. Apenas o primeiro de todos os medos a serem reconhecidos.
. Debate interno.
. Inquietude.
. Medo.

- 4a, dia dedicado ao meu Tricolor Paulista. Muita fila para comprar o ingresso. Muito trânsito para chegar no Morumbi. Ameaça de roubo do meu carro lá, na frente do Estádio. A cavalaria empacada na nossa frente na hora de entrar no Estádio. Tudo lotado na Independente. Um gol assim que entramos, já no final do 1o tempo, e a melhor companhia do mundo para um jogo no Morumbi. O jogo emocionava, as jogadas apertavam o coração, mas aquilo era um a zero e eles com dez, nós com onze. No segundo gol o Morumbi foi abaixo, os meninos caíram em cima de mim. A gente cantava insanamente, gritava, ria, e não se entendia mais. O Estádio era fumaça e muita gente, muito grito, muito barulho. Na saída, fui na frente, os meninos ficaram para trás. Saiu a Independente. Não tinha como eu fugir. Comecei a pular, fingi que estava em Salvador, me joguei no meio, resolvi curtir a bagunça ao invés de me preocupar com ela. Chegamos em casa sãos e salvos, felizes e vitoriosos.
. Apreensão.
. Glória.

- 5a e o show da surpresa, do presente de aniversário e de Dia das Mães. No palco, ninguém menos do que Johnny Rivers, o cara que faz minha mãe cantarolar pela casa. Nós quatro no segundo melhor lugar do show. Ela desacreditava na surpresa que tínhamos aprontado para ela, e nos olhos aquele brilho molhado de lágrimas se formando não deixava ela mentir: sim, conseguimos emocioná-la. Eu e o irmão éramos de uma faixa etária bem diferente do público do show em geral, mas sabíamos os Greatest Hits tanto quanto todos que estavam lá, devido ao CD de 20 Greatest Hits que temos. "Poor side of town" foi demais, "Take a good look at my face" também. Nós quatro com um lindo gosto melancólico daquele passado quando íamos sempre para Campos para nos curtir, e que Johnny Rivers costumava ser nossa trilha sonora preferida.
. Emoção de amor em família.
. Saudosismo.

- 6a e o dia tirado para descanso. Um pouco de raiva do mundo e das decisões precipitadas. Muitas saudades da yoga nossa de toda semana. Desmarca a noite, desmarca o almoço. Fica a manicure e a reunião com a sócia. Faz só o que você quer, respeita seus limites, os físicos e os psíquicos. Dorme cedo, menina. Dorme cedo, que sábado promete.
. Uma pitada de egoísmo saudável.

- Sábado de tudo ao mesmo tempo agora. Recital, almoço, café, festa. Recital que aquece o coração com aquela sensação de realização que todo mundo tem quando fecha um ciclo. Almoço de falas sussurradas faladas lentamente, mas sensação absolutamente ensurdecedora. Lá, no meio do restaurante, tirei minha armadura com vontade, expus meus sentimentos, expus meus medos, e pedi desculpas. Fiquei pelada e vulnerável, metaforicamente falando - claro. Compensou em excesso. Cafézinho de meninas de fofocas de lembranças de matar as saudades de sentir calorzinho no coração. Um abrigo, um refúgio, um cafuné, e estou nova. Pronta para ficar pelada de novo. E todo mundo espera alguma coisa de um sábado à noite, então resolvi ir em uma festa para ser inesquecível. Inesquecível tudo, a vista do apê, as pessoas legais, a viagem solitária e gostosa só eu debaixo do céu, as músicas, as conversas, as sensações. Sabe a famosa chave de ouro? Pois bem, essa festa foi exatamente isso. Deixa, menina, larga lá atrás essa semana que acabou. Que ela não seja seu fantasma na próxima semana. Ela ficou bem lá, dentro do apê da Praça da República. A semana ficou sozinha naquela cobertura, ela debaixo do céu paulistano.
. Calorzinho no coração.
. Desafio.
. Abrigo.
. Chave de ouro.

- 5a eu aprendi que SMS definitivamente não serve para nada e que nada mais é do que uma enorme porcaria. Para mandar mensagens para confirmar coisas, para mandar mensagens fofinhas, para falar de saudades, para isso SMS pode até servir. Para ter uma DR, nunca. Para terminar um relacionamento, jamais. Para machucar alguém com um belo dum mal entendido, para isso sim, a SMS é a melhor arma. Também aprendi que afeto se demonstra, na lata. Eu, que sempre fui tão contida com medo de ficar over, descobri que ser contida pode machucar. Ué, mas não era para irmos devagar? Não era para não namorar? Pois é, sem medo de ficar over, saiba: afeto se demonstra.
. Libera esse afeto, sem medo de ser feliz.

- 4a de novo eu pude observar as conversas de fim de vida que minha avó tem com as primas dela nos chás da tarde mais deliciosos do mundo. Aprendi que mesmo aquelas velhinhas, que têm aparentemente tudo, têm na verdade uma melancolia impossível de ser descrita. Todas elas. Uma referência do que poderá vir a ser meu final de vida. A sensação reinante de bittersweet.
. Melancolia.

No sétimo dia Deus descansou.
Eu me cansei.
Festa em família aqui em casa das 13hrs às 22hrs, pelo Dia das Mães.
Os sentimentos estavam mais neutros, no entanto, já no presságio de uma melhor semana.

5.5.08

All at Sea, Jamie Cullum

I'm all at sea
Where no-one can bother me
Forgot my roots
If only for a day
Just me and my thoughts sailing far away
Like a warm drink it seeps into my soul
Please just leave me right here on my own
Later on you could spend some time with me
If you want to
All at sea
I'm all at sea
Where no-one can bother me
I sleep by myself
I drink on my own
Don't speak to nobody
I gave away my phone
Like a warm drink it seeps into my soul
Please just leave me right here on my own
Later on you could spend some time with me
If you want to
All at sea
Now I need you more than ever, I need you more than ever, now
You don't need it every day
But sometimes don't you just crave
To disappear within your mind
You never know what you might find
So come and spend some time with me
We will spend it all at sea
Like a warm drink it seeps into my soul
Please just leave me right here on my own
Later on you could spend some time with me
If you want to
All at sea

Estou hoje o dia inteiro ouvindo essa música.
Minha sessão de acupuntura foi demolidora e edificadora ao mesmo tempo.
Preciso ficar um pouco quieta ao invés de sair por aí travando batalhas com pessoas que me querem bem.
Azedume e eu não se dão bem.
Agressividade e eu nunca tiveram nada a ver.
Aqui, no meu cantinho, e em silêncio. All at sea.

2.5.08

Que chuuuuuva!

Desobedeci.
Mesmo.
Com vontade.
Desobedeci minha acupunturista, que diz que friagem é o pior crime que um ser humano pode fazer com ele mesmo.
Desobedeci minha avó, que diz que umidade para a mulher naqueles dias é absolutamente proibitiva.
Desobedeci meus pais, que me deram dinheiro para ir de táxi na ida e na volta, para evitar a chuva.

Desencanei do frio que está lá fora, frio úmido e doído apertado.

Eram oito quadras a pé, da entrevista para a minha casa. Estava com uma capa de chuva francesa (u-lá-lá) azul-quase-cinza, lindona. Liguei a música no celular e coloquei os fones de ouvido. Capuz, uma respirada seca no coberto para pegar o fôlego, e vai.

As calçadas paulistanas são péssimas. Isso é senso comum. O que não se sabe ao certo é o perigo que elas representam em dias de chuva. Contabilizei sete quase-tombos. E seriam daqueles bonitos, dignos de uma videocassetada das mais engraçadas. Tem um tipo de pedrinha que é inimiga especial dos pedestres em dias de chuva. E a calçada com texturas, nesse esqueminha modernoso que alguns prédios de escritório têm aderido ultimamente, também é bem complicadinha. Então desci em um ritmo entre a caminhada e o samba, com muita dança, para não cair.

Passando por mim, uma mulher, louca, sem guarda-chuva, que dizia: "que chuuuuuva!", e eu imaginei de verdade a angústia dela, por ela estar descoberta.

Eu não. Ah! Eu tinha a minha capa de chuva... mas, sabe, ela ia até metade da cocha. Depois de umas quadras de caminhada, percebi que meu jeans na altura da cocha onde a capa acabava começou a grudar na perna. Percebi também que a sola de couro da minha bota foi deixando minha meia bastante úmida e fria. E por último percebi que o capuz cobre bem a cabeça, é fato, porque ele é farto. Mas ele é ligado à capa por botões, e o espaço entre o capuz e a capa, onde não tinha botões, foi aos poucos encharcando minha nuca. Também notei que eu deveria ter prendido meu cabelo em um coque, porque do jeito que ele estava solto, as pontas estavam ficando molhadas.

Mas mesmo assim, mesmo me molhando aos poucos e consideravelmente; mesmo passando frio; mesmo quase caindo; mesmo assim eu estava lá, desobedecendo com gosto e tomando chuva. E estava fazendo a coisa certa. Eu queria viver a rua paulistana em uma emenda de feriado chuvosa. Aquela coisa meio híbrida entre o dia útil e o dia de folga, entre a cidade vazia e a cidade cheia, aquela coisa meio híbrida que é a água que desce forte do lado da sarjeta, que não é asfalto e não é calçada, não é rio e nem enchurrada, mas molha de verdade.

Quando eu cheguei em casa, olhei no espelho do elevador aquela cena patética da calça ensopada, da capa que se mostrou boa só para dias de garoa, da bolsa pingando, das pontas do cabelo bem molhadas. Eu olhei e ri, ri bastante, ri deliciosamente, como criança que faz traquinagem. Eu estava molhada e com frio, mas estava absolutamente realizada.

Para não parecer uma pessoa totalmente insana, vale constar: assim que cheguei em casa tomei um bom banho quente.

Ainda no contexto do cachecol florido, o que eu tinha lá no fone de ouvido do celular ainda era a trilha sonora da Amèlie.

O Cachecol Florido

OU: Celebrando um dia chuvoso de outono frio

Ele sempre fica lá no meu armário e é o mais difícil de guardar ajeitadinho, porque ele tem umas flores de tricot que ficam penduradas e atrapalham tudo... ao mesmo tempo que eu tenho que ter todo o cuidado do mundo para as flores não fugirem e caírem, descosturadas por algum movimento brusco.

Verde, entre o bandeira e o militar, borda de tricot inteira em verde entre o abacate e o limão, galhinhos na mesma cor da borda, e flores penduradinhas nos galhinhos. Flores, de todas as cores: miolo amarelo e contorno vermelho, miolo roxo e contorno azul, são muitas as flores que ficam penduradas. E aí elas balançam com o cachecol, conforme eu ando. Praticamente um jardim ambulante. Bonito. Doce. Colorido. Verde.

É a graciosidades em um dia de outono. Ao sair para o café, e eu queria isso, queria leveza, queria cor, queria graciosidade, coloquei o cachecol. As flores balançavam. Parece que dá para sorrir mais fácil. Parece que o óculos vermelho fica mais legal. O frio fica mais quentinho. Cores em um feriado de uma São Paulo acinzentada.

Cheguei em casa e vi a Amèlie. Não porque eu estava triste ou sonolenta, mas porque eu queria ter em casa uma continuação dessa celebração ao outono. Agora, escrevo esse post ao som de sua deliciosa, por que não suculenta?, por que não graciosa?, trilha sonora.

Depois saí de novo. Uma simples ida à padoca, ver o jogo do Santos. O cachecol me acompanhava de novo. Bons papos, aquela coisa discutindo relacionamentos de homens e mulheres e suas complicações, e éramos quatro na mesa, dois homens e duas mulheres, e todo mundo com um vasto conhecimento em histórias bizarras, tristes, felizes, bem-sucedidas, mal-sucedidas, de relacionamentos.

Cheguei feliz de volta em casa. Já não chovia mais. O frio estava apertando os ossos. O cachecol estava no pescoço. As flores ainda balançavam. Me descobri feliz, simplesmente pelas pessoas especiais que me cercam. Me descobri complexa, como todo mundo no mundo, um mundo sem pretos e brancos, e sim cinzas e, principalmente, coloridos.

Ao dormir eu sorria. Quando acordei, fiquei com vontade de usar o cachecol hoje de novo.