17.7.08

Nossa amizade com os Gnomos mudos e invisíveis

Hoje li a Boneca Falante e resolvi que queria dialogar com ela e as memórias da infância. Isso foi inspirado também depois que sexta assisti ao sensível, delicado, divertido e delicioso "Pequenas Histórias", filme infantil nacional, desses que mexe mesmo é com o nosso imaginário.

E na verdade aqui vou colocar uma longa memória, que volta mais especificamente ao ano de 1991.
Mais especificamente, férias de Julho de 1991.
Mais especificamente ainda, passadas em Monte Verde, no Cabeça de Boi - um hotel fazenda que me parecia super.

Fomos, os quatro. Em julho de 1991 eu ainda ia fazer 9 anos, e estava na 2a série da escola. Foi uma semana daquelas que toda criança que se preza gosta: andar a cavalo, brincar com monitores do hotel, caçar girinos na beira do lago no final da tarde, ou então descer do hotel para a vila (naquela época Monte Verde era isso, uma vila) e comer chocolate, fazer trilhas, sujar a calça de moleton de lama...

Eu e o Edudu tínhamos um particular apreço por inventar caminhos, rotas, passagens secretas... e em um hotel fazenda gigantesco e cheio de araucárias, isso era de fato o que de mais legal se poderia fazer. Lembro direitinho, nossos dias eram divididos mais ou menos da seguinte forma: a manhã era ocupada por passeios com os nossos pais, visitar pesqueiros, andar a cavalo, fazer trilhas até os picos, etc; voltávamos para o hotel para o almoço, e na hora que nossos pais voltavam para o chalé para a siesta, a gente ia desbravar novos territórios. Às vezes nossa expedição durava até o anoitecer; às vezes, voltávamos ao chalé no final da tarde para irmos passear na vila com os pais (isso dependia do quão interessante estava a expedição daquela tarde).

Em um desses dias de idas à Vila, acompanhamos os pais em uma visita a uma loja cheia de coisas meio místicas. Na memória, fica a idéia que a dona da loja era meio que uma bruxa, mas eu não saberia dizer ao certo. E ela falava bastante sobre o vento, o vento que leva, o vento que traz, os cheiros, e o vento isso, o vento aquilo... E começou a conversar comigo e com o Edudu sobre o fato que Monte Verde é habitada por Gnomos e que eles ficavam escondidos nos bosques, no pé das árvores.

Não preciso falar que depois disso nossas expedições nunca mais foram as mesmas, né?
Acho que passamos duas semanas por lá, e o encontro com essa mulher foi tipo no dia 4 ou 5 da viagem. Todos os outros 9 dias de viagem passaram a ter uma magia implícita muito forte. A gente não ia mais fazer expedições pelos bosques do hotel - a gente ia procurar gnomos nos bosques do hotel. A bruxa da loja tinha dado algumas dicas preciosas: por exemplo, que gnomos gostavam de cocô de vaca para alimentar seus animais de estimação; que eles também gostavam de frutas silvestres vermelhinhas de um tipo de arbusto que tinha em abundância por lá; e que o jantar deles era pinhão. Então todos os dias antes de sairmos para a expedição, pegávamos sacolinhas plásticas na recepção do hotel, e saíamos recolhendo os ingredientes que precisávamos: cocô de vaca, as tais frutinhas vermelhas, e pinhões desses que caem no chão e a gente sai catando. O Edudu achou que seria bom se levássemos chá de erva doce para dar de beber para os Gnomos, então pedíamos uma garrafa térmica desse chá no restaurante e levávamos juntos.

Com tudo isso de aparatos, quando chegávamos em alguma lugar que a gente achava que teria Gnomo, sentávamos quietinhos e começávamos a espalhar as coisas pelo chão - forrado de folhas secas de inverno, para não sujar nossas oferendas aos gnomos. Agora nossa diversão era ficar quietinho, em algum canto longínquo e silencioso do bosque, esperando nossos amigos Gnomos chegarem.

Até que um dia, depois de algumas tentativas mal-sucedidas, eu e o Edudu preferimos acreditar que Gnomos eram seres invisíveis, que só apareciam quando eles queriam aparecer. E a gente gostou dessa nova idéia, porque ela significaria automaticamente que então em todas as outras tardes de supostas tentativas mal-sucedidas, na verdade a gente ficou o tempo todo brincando em silêncio com Gnomos, sem nunca nem sabermos disso. E na verdade os Gnomos eram sim mudos e invisíveis, mas eles nunca foram silenciosos: ora, o que seria então aqueles passos que ouvíamos nas folhas? Ou o barulho de alguma coisa caindo da árvore? Ou o vento batendo nas folhas? O que seria tudo aquilo, se não as mais concretas provas de que estávamos na companhia de Gnomos mudos e invisíveis??

Essa idéia dos Gnomos mudos e invisíveis evoluiu tanto que eu cheguei, algumas vezes, em acreditar que eles tinham vindo para São Paulo com a gente, no banco de trás, sem a gente nem perceber. Então eu acordava no meio da noite, e falava para a minha mãe que não estava conseguindo dormir porque estava preocupada com os Gnomos. E ela me levava para fazer um tour pelo apartamento, para eu ver que não tinha nenhum Gnomo ali (minha mãe nunca entendeu exatamente o conceito de "Gnomo mudo e invisível"). Eu insistia que sim, que o Gnomo estava de fato ali, ela é que não enxergava, porque ele era invisível.

"Viu, mãe? In-vi-sí-vel! Tudo que é invisível a gente não enxerga!"

A partir dessa noite, em que brigamos pelo conceito de invisível que ela não entendia, ela deixou que a gente começasse a deixar comidinhas pros Gnomos antes de irmos dormir. Passou a ser todo um ritual de preparação antes de irmos dormir: cenoura, pepino, alguma frutinha, um copo d'água, um pouco de chá de erva doce (o Edudu insistia no chá). A partir daí a gente começou a dormir tranquilo, que os Gnomos estavam bem cuidados.

O padrão que a gente seguia era o mesmo da época de Natal, quando deixávamos um monte de comida para a Rena do Papai Noel, e no dia seguinte quando a gente acordava o chão estava todo bagunçado de comidinhas, porque a Rena tinha se alimentado direitinho! E para o Coelhinho da Páscoa também, deixávamos cenoura e água, e no domingo de Páscoa tinha pedacinhos de cenouras por todos os cantos da sala (o Coelhinho da Páscoa que visitava a nossa casa era muito porcalhão). Os Gnomos também faziam a maior bagunça com a comida durante a noite.
(Algum tempo depois, quando descobri que não existe Papai Noel e nem Coelhinho da Páscoa, fiquei super decepcionada de saber que na verdade eram os meus pais que bagunçavam a comidinha)

Toda essa história de ter Gnomos em casa fez com que eu ganhasse um livro sobre Gnomos de presente dos meus pais, e aí, para completar a volta toda, a Boneca de Pano falou desse livro no post dela sobre memórias de infância que ela andou visitando ultimamente.

Eu adorei esse livro, e hoje eu peguei ele na estante para ler, e é coisa linda demais. Umas aquarelas lindas de Gnomos, ilustrações enormes, milhares de lendas, explicações sobre as casas dos Gnomos, as famílias, as roupas, tudo...

4 comentários:

Fernanda Bello disse...

Eu ainda acredito em gnomos. Em fadas também. rs. É verdade.
Beijo!

Emilia disse...

esse livro é demais de lindo.
adorei nosso encontrinho ontem!
bjs
mi

Anônimo disse...

olá, meu nome é Alessandra e meu namorado, hoje com 49 anos, disse que há 15 anos, ele e seu filhinho, viram um Gnomo em Monte Verde. Um pequeno homem de 30 cm no máximo...Minha mãe já havia visto também na década de 40. Bem, neste final de semana, levei meu filho de 10 anos a Monte Verde e ele "brincou" o tempo todo com eles, saindo convicto de sua existência, sem tê-los visto. Ele adorou ler seu post..obrigada por lembrar, pois as pessoas de Monte Verde esqueceram q lá é a cidade dos gnomos, ninguém mais comenta....
bjus,

Lala.L.P. disse...

qual o nome desse livro sobre gnomos ?